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Por Ferreira Moreno
Como em tempos escreveu o Padre Júlio
da Rosa, a tradição açoriana em celebrar
a miraculosa subida de Nossa Senhora aos céus, “despontou
no dia feliz de 15 de Agosto de 1432, festa da Senhora da Assunção
que, abrindo o manto das ondas e do firmamento, mostrou sob o
seu manto a ignorada Terra Açoriana, elevando-se do túmulo
do ignoto p’ró firmamento da fé e da civilização.”
(Insulana, Volume VI, Números 1 & 2, Ponta Delgada
1950).
De facto, ao recordar o descobrimento da primeira ilha do arquipélago
açoriano, Gaspar Frutoso, já havia apontado: “Com
grande contentamento de Gonçalo Velho e de sua companhia,
foi celebrado aquele dia da Assunção de Nossa Senhora
com duas alegres festas, uma por entrar a Senhora no Céu,
outra por entrarem eles naquela ilha nova.” (Saudades da
Terra, Livro III, Pág. 6, Edição 1998).
Os exploradores desembarcaram numa pequena praia,
localizada entre duas pontas que ficariam conhecidas por Ponta
dos Lobos (pela presença de lobos marinhos) e Ponta do
Cabrestante (pela semelhança com um aparelho de levantar
âncoras). Seguidamente, os primeiros povoadores ergueram,
neste sítio, uma rudimentar construção de
madeira e palha, a que deram o nome de Ermida de Nossa Senhora
dos Anjos.
A ilha de Santa Maria tornou-se assim, no primeiro solar da Virgem
no Arquipélago.
Anos depois, com o estabelecimento da Vila do Porto, a respectiva
igreja matriz foi dedicada a Nossa Senhora da Assunção.
Mais tarde, quando outros exploradores passaram a povoar a ilha
de S. Miguel, no areal da Povoação Velha surge uma
igreja “da avocação de Nossa Senhora dos Anjos,
cuja festa principal se celebra aos quinze dias do mês d’Agosto.”
(Saudades, Livro IV, Edição 1998).
Na mesma página (149), Frutoso informa-nos ainda que “por
andarem neste tempo ocupados os fregueses em recolher suas searas
e em outros trabalhos, celebram agora a festa a oito de Setembro.”
Este histórico pilar da devoção açoriana
à Senhora da Assunção, receberia posteriormente
a invocação de Nossa Senhora Mãe de Deus,
e finalmente a de Nossa Senhora do Rosário, quando se deu
início à construção em 1848 (noutro
local) da igreja matriz da Povoação, a qual abriu
ao culto em 1856 com o título de Nossa Senhora Mãe
de Deus.
Em 1956, p’ra comemorar a passagem do primeiro centenário
desta igreja, realizaram-se “festas de arromba’na
Povoação, culminando com uma vistosa procissão
em que se incorporaram as imagens dos santos padroeiros de toda
a ouvidoria. E assim, do Faial da Terra, veio Nossa Senhora dos
Remédios; das Furnas, a Mãe da Mãe de Deus,
ou seja, Santa Ana, compareceu num jardim de flores; e da Ribeira
Quente, os pescadores trouxeram pelo mar o seu padroeiro S. Paulo,
em barco engalanado.
Se fores à Povoação
Desce abaixo ao pé do mar,
Faz lá muitas visitas
A quem por mim perguntar.
Tu és c’m’o leite,
Rosada c’m’o açafrão,
Tu és a cara mais linda
Da Vila da Povoação.
No que diz respeito à antiga igreja matriz
de Nossa Senhora dos Anjos na antiga vila de Água de Pau,
desconhece-se a data exacta da sua fundação. No
entanto, uma carta datada e passada em 1488 a favor de Frei Estêvão,
aponta ser ele o capelão de Santa Maria dos Anjos na Vila
Nova de Água de Pau. (Padre João José Tavares,
A Vila da Lagoa & O Seu Concelho).
A primitiva igreja foi destruída pelo sismo de Vila Franca
em 1522, mas reconstruída poucos anos depois. A actual
imagem de N.S. dos Anjos, entronizada no altar-mor desde 1859,
veio substituir uma outra imagem da Virgem de mãos postas,
que foi transferida p’ró altar do Santo Cristo dos
Terceiros com o título de N.S. da Conceição.
Adeus, Senhora dos Anjos,
Romaria de nomeada;
Foi lá que te conheci,
Ó minha prenda adorada.
Adeus, Água de Pau,
Que não te torno a ver,
A Senhora dos Anjos
Nunca me há-de esquecer.
Ainda em S. Miguel, temos a igreja paroquial
de N.S. dos Anjos na Fajã de Baixo, cuja primitiva igreja
construída em 1532, conforme o testemunho de Joaquim Cândido
Abranches, “ficava um pouco acima da actual, no mesmo lugar
onde no século passado existia uma quinta de Manuel Inácio
da Silveira.”
Em 1662 a igreja encontrava-se bastante degradada, pelo que foi
necessário proceder a obras de restauro, enveredando-se
finalmente p’rá construção duma igreja
nova que ficou concluída em 1791. (Apontamento Histórico
& Etnográfico, Volume V, Ponta Delgada 1989).
O Padre José Jacinto Botelho (1876-1946) é o autor
desta quadra: “Ó terra de S. Miguel/Noiva beijada
d’aurora/És altar por nossos pais/Erguido a Nossa
Senhora.”
Foi o Papa Pio XII quem, em Novembro de 1950, proclamou a Assunção
de Nossa Senhora com dogma de fé, confirmando assim a crença
originada nos primórdios do Cristianismo.
No ano seguinte, em San Leandro da Califorlândia, era estabelecida
a paróquia “Assumption of the Blessed Virgin Mary”,
e mais recentemente ergueu-se, no Vale de San Joaquin, a Igreja
de Nossa Senhora da Assunção dos Portugueses na
cidade de Turlock.
Mas a primeira referência à Assunção
na Costa do Pacífico encontrámo-la nas crónicas
do engenheiro militar Miguel Costanso e do padre franciscano Juan
Crespi, que acompanharam a expedição do Capitão
Gaspar de Portolá. Com a data de 14 d’Agosto de 1769,
ambos escreveram que, por ser a véspera da festa, haviam
afixado o nome de “La Asunción de Nustra Señora”
ao local do acampamento. Aqui, a 60 milhas norte de Los Angeles,
num Domingo de Páscoa (31/março/1782), seria fundada
a Missão San Buenaventura.
Francis X. Weiser (Christian Feasts & Customs) e Robert J.
Myers (Celebrations & American Holidays) são unânimes
em afirmar que “nos países latinos, especialmente
em Portugal, respeita-se a tradição de benzer os
barcos de pesca na Festa d’Assunção, tradição
que ainda hoje se observa nos Estados Unidos no dia 15 d’Agosto.”
Ó Senhora d’Assunção,
Eu hei-de ir à vossa festa,
Escolher um namorado,
Pois o que tenho não presta.
Ó Senhora d’Assunção,
Eu p’ró ano lá hei-d’ir,
Ou casada ou solteira,
Ou mocinha de servir.
Ó Senhora d’Assunção,
Qu’estais no cabecinho,
Deitai o peitinho de fora,
Dai de mamar ao Menino.
Ó Senhora d’Assunção,
Ó minha tão bela flor,
Ligai o meu coração
Com ligas do vosso amor.
A Senhora d’Assunção
Já lá fui e hei-de tornar,
Que m’esqueceu a mantilha
Dobrada no seu altar.
A Senhora d’Assunção
Tem um navio de vidro,
Que lho deu um marinheiro
Que no mar se viu em p’rigo.
A Senhora d’Assunção
Tem um manto de veludo,
Que lho deram os estudantes
Quando vinham do estudo.
A Senhora d’Assunção
Tem uma fita amarela,
Que lha deram os rapazes
Quando foram p’rá guerra.
Á oliveirinha do adro
Não lhe deiteis o podão,
Que alumeia tod’a noite
A Senhora d’Assunção.
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