Batalha de Batatas


Por Ferreira Moreno

Tenciono preencher a crónica desta semana com a narrativa do mais curioso combate naval, ocorrido durante a segunda Guerra Mundial e travado na tarde do dia 20 de Dezembro de 1941, ao longo da costa da Califorlândia com as montanhas de Santa Cruz a servirem de testemunhas.
Uma ligeira reportagem desse extraordinário incidente encontra-se patente na página 463 do livro “Historic Spots in California”, quinta edição revisada por Douglas kyle, Stanford Universtiy Press 2002.
Os adversários eram constituídos pelo submarino japonês I-23 e o navio-tanque Agwiworld sob o comando do Capitão Frederico B. Gonçalves. O autor não identifica a terra de origem do Capitão Gonçalves, que presumo ser de naturalidade portuguesa. Apenas somos informados que o indefesp navio-tanque pertencia à Richfield Oil Company, e singrava de Los Angeles com um carregamento de óleo p’ra San Francisco.
Assim que o submarino japonês emergiu e deu início ao ataque, o Capitão Gonçalves reagiu com invulgar bravura, dando ordens à tripulação p’ra navegar o “tanker”de proa em direcção ao inimigo a fim de abalroá-lo.
Perante tamanha audacidade, o submarino recuou momentaneamente. Foi o bastante p’ró Capitão Gonçalves compreender quer a futilidade quer a temeridade do contra-ataque, e imediatamente zarpou a caminho (passe a expressão) de Santa Cruz.
O submarino, porem, não desistiu na perseguição e começou novamente a metralhar o indefeso “tanker”que, no entretanto, seguia em ziguezague de proa virada a um vento forte e mar revolto, conseguindo escapar assim sem ser atingido p’las granadas nipónicas.
Consta, que enquanto estas manobras se iam desenrolando, os tripulantes do “Agwiworld”começaram a atirar batatas contra o submarino que, devido ás águas turbulentas encharcando o piso da artilharia, desistiu no prosseguimento do ataque.
Ao fim e ao cabo, o navio-tanque arribou a Santa Cruz sem mais transtornos!
No entanto, ficou-me a magicar qual o motivo que terá levado o submarino a não torpedear o “tanker”... será que à falta de arroz, os japoneses aproveitaram-se das batatas p’ra confeccionar saki?
Saki, evidentemente, é uma bebida alcoólica japonesa feita à base de arroz fermentado.
A minha curiosidade intensificou-se, ainda mais, ao descobrir que precisamente nesse mesmo dia (20 de Dezembro de 1941), aproximadamente a 200 milhas norte de San Francisco, um outro submarino japonês torpedeou o navio-tanque Emidio da “General Pretoleum Corporation”, causando cinco mortes.
O “tanker”andou à deriva e acabou por afundar-se nuns rochedos perto da Crescent city.
O toponímio desta cidade deve-se ao facto de possuir uma baía em forma do quarto crescente lunar. Aos 27 de Março de 1964, Crescent City foi devastada por uma onda tsunami, que causou grande prejuízos materiais, mas milagrosamente não se registraram quaisquer desaparecimentos ou mortes dos habitantes.
Del Norte é um derivativo do espanhol; este concelho fica situado na extremidade noroeste da Califorlândia, e contíguo ao Estado de Oregon. Tal qual como aconteceu (em anos passados) com o concelho do Nordeste, em S. Miguel dos Açores, o Del Norte County foi, durante muitas décadas, um dos mais inacessíveis concelhos californianos, visto carecer dos famigerados caminhos de penetração.
Com a descoberta de ouro nesta área, por volta de 1851, é que os primeiros povoadores (mineiros e aventureiros) se estabeleceram e fundaram Crescent City. Mas isto é outra história p’ra futura consideração, pois que ainda agora trago gravadas na memória um rol de imagens panorâmicas das minhas excursões pelo interior e ao longo da sinuosa costa do concelho Del Norte!
São de João Teixeira de Medeiros (1901-1995) os versos que se seguem:

Vi num canto do Nordeste
Miradouros qu’eu recordo;
Vi brincar o vento leste
Na fajã e Lombo Gordo.

Vi em diversas tardinhas
De mornura soalheira,
O mar d’espumas mansinhas
A namorar a ribeira.

Perguntei à ilha calma
Pelo velhinho Nordeste;
Respondeu; Está na tu’alma,
Desde que a alma lhe deste.

S. Miguel, que lindo jeito
Minh’alma te soube dar!
Cabes-me toda no peito
Sem nada fora ficar.