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Por: Ferreira Moreno
O saudoso Dr. Urbano de Mendonça Dias
(1878-1951) no seu precioso livrinho “A História
do Vale das Furnas”, publicado em 1945, deixou dito que
a primeira ermida ali edificada recebeu a linda e sugestiva invocação
de Nossa Senhora da Consolação, embora sem precisar
a data da sua fundação, o Dr. Urbano é deveras
generoso em elogiar a nobreza de sentimentos e religiosidade de
Sebastião Afonso da Costa Columbreiro que, além
de ser o directo responsável na construção
da ermida, ali viveu como ermitão até o dia em que
faleceu.
Aparentemente tinha enviuvado e repartido os seus haveres com
os filhos, antes de seguir p’ro Vale das Furnas que, ao
tempo era ainda despovoado, excepto por umas cafuas de palha e
colmo, dispersas por entre mantas e pastagens, onde por vezes
pernoitavam pastores e carvoeiros.
Em conformidade com o testemunho de Gaspar Frutuoso (Saudades
da Terra, Livro IV, Cap. VI, Pág 32, Edição
1998), Sebastião Afonso teria casado com uma senhora da
vila de Água do Pau, de quem teve dois filhos e quatro
filhas. Frutuoso prossegue com esta curiosa narrativa: “Este
Sebastião Afonso, sendo depois de muito velho ermitão
nas Furnas, teve um galo que pelejava cruamente com os homens
que lhe cantavam como galo, ferindo-os com o bico e esporões,
com tanta braveza que não podendo com um pau, uma vez,
defender dele um homem, chamou “aqui del-rei” sobre
ele arrancando a espada, com que ainda se não pudera valer,
se outros os não apartaram acudindo ao ruído”.
Outra curiosidade, transmitida por Frutoso, indica ter existido
no Algarve “um homem nobre e rico, da casa do Infante D.
Henrique”, o qual tinha muitos filhos e filhas, netos e
netas, e uma horta com muitíssimos cogombros (pepinos).
O Infante, então, fez mercê em dar-lhe o apelido
de Cogombreiro que, posteriormente, seria conhecido por Colombreiro.
Como acima escrevi, desconhece-se a data exacta da fundação
da pequenina e singela ermida da Senhora da Consolação.
No entanto, deparei com uma valiosa referência no trabalho
do Padre Herculano A. de Medeiros, ao título de “Autoridades
Eclesiásticas em S. Miguel com Jurisdição
Delegada” e que se encontra transcrito no Volume XIV do
“Arquivo dos Açores”, onde se diz que devia
ter sido no tempo de Frei Manuel Rodrigues Pereira, ouvidor e
visitador em 1538, que Sebastião Afonso foi viver p’ras
Furnas e ali edificou uma ermida, a primeira que ali houve, de
que foi ermitão por muitos anos e com muita probabilidade
lá morreu.
Quero registar ainda que Frei Manuel Rodrigues Pereira exerceu
as funções de vigário da Igreja Matriz de
Nossa Senhora da Estrela da Ribeira Grande, e foi o imediato antecessor
do Rev. Dr. Gaspar Frutoso, nomeado vigário da Matriz em
1565.
Regressando à ermida de N. S. da Consolação,
e baseando-me novamente no testemunho de Frutuoso, é mais
do que evidente que a ermidinha foi de algum modo descurada e
derrelicta após o desaparecimento do ermitão, visto
que “agora com grande custo, mandou consertar o magnífico
e liberalíssimo Baltazar de Brura da Silveira”.
Este indivíduo era um ricaço comerciante ribeiragrandense,
que se havia estabelecido em Sevilha, e resolvera voltar a S.
Miguel, enamorando-se do Vale das Furnas e da Ermida. Porém,
não se adaptou a tamanho isolamento, regressando de novo
p’ra Sevilha, onde fundou o convento dominicano de S. Jacinto
e onde faleceu em 1609.
D. Manuel da Câmara, capitão do donatário
(1601-1619), foi igualmente um grande benfeitor da ermida, tendo
contribuído p’ra sua manutenção, não
só acudindo com os consertos necessários, mas construindo
também uma pequena casa (junto à ermida), onde por
vezes ia descansar, e onde manteve (por largos anos) um criado
seu, como ermitão encarregado de velar pela ermida e pelo
lampadário que, de dia e noite, ardia no altar. Por ser
muito propenso às práticas religiosas há
quem erroneamente, acredita que foi Manuel da Câmara quem
construiu a ermida em 1613. Alias, convém recordar o que
o Padre Herculano de Medeiros escreveu: “Foi a esta ermida
que João Gonçalves Perdigão, Escudeiro da
Casa Real, deixou um legado de cem reis por seu testamento em
1551.”
O Ermitério do Vale das Furnas continuou a florescer com
a chegada em 1614, dos Padres Diogo da Madre de Deus e Manuel
da Anunciação, vindos do Continente a convite do
Padre Luiz Ferreira, natural de S. Miguel. O Padre Diogo, eleito
ministro-superior, viria a falecer aos 11 d’Abril de 1630,
sucendendo-lhe no cargo o Padre Manuel da Anunciação.
Foi durante o seu ministério que, na noite de dois de Setembro
de 1630, teve início uma violenta e pavorosa erupção
vulcânica, queimando e assolando o Vale das Furnas, soterrando
a ermida e o convento dos eremitas. Estes fugiram p’rós
lados do norte da ilha.
E assim desapareceu a mimosa e poética Ermida de Nossa
Senhora da Consolação!
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