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Por: Dr. Tomás Ferreira
Os resultados das eleições para
o parlamento do Canadá podem ter consequências para
a vida de todos nós que vivemos neste país, quer
sejamos cidadãos ou apenas imigrantes. Saúde, educação,
assistência infantil, serviços sociais e as grandes
cidades como Toronto, Montreal e Vancouver, irão ser atingidas
por um governo pertencente ao novo Partido Conservador –
não confundir com o antigo que se chamava Progressista
Conservador – interessado em fazer cortes nos impostos à
custa de economizar nos serviços que oferecem ao povo e
a gastar dinheiro nas coisas militares suportando as aventuras
dos Estados Unidos, como a invasão do Iraque ou outras
futuras guerras do Sr. George Bush ou seus sucessores.
Felizmente não está tudo perdido, uma vez que o
partido dirigido pelo Sr. Stephen Harper não obteve a maioria,
e não conseguirá levar para frente o seu verdadeiro
programa, que habilidosamente soube disfarçar durante a
campanha eleitoral, a mais dissimulada e sofisticada que vi em
cerca de meio século a seguir estas coisas, primeiro em
Inglaterra e depois no Canadá.
Conforme tinha previsto no meu último artigo baseado nas
sondagens de opinião pública, os Conservadores conseguiram
vender, pelo menos em certas partes do país, o tal “gato
por lebre”isto é o Sr. Stephen Harper, antigo líder
das organizações de extrema direita “National
Citiziens Coalition”(Coligação Nacional de
Cidadãos), Partido Reformador e Aliança, como Primeiro
Ministro do Canadá.
Mais uma vez o sistema eleitoral em que vivemos deu resultados
que não correspondem à realidade do voto popular.
Os Conservadores que conseguiram apenas 36,5% dos votos, vão
formar o governo, enquanto que o Partido Liberal com 30,1% e o
NDP com 17,4%. O que dá no seu conjunto 47,5% ficaram na
oposição. Felizmente, para todos nós que
vivemos neste país e não somos milionários,
o partido conservador terá 124 deputados, enquanto que
os liberais e o NDP, obtiveram respectivamente 103 e 29 membros
no parlamento. A propósito, o partido separatista o Bloco
Quebeque, com apenas 10% do voto popular conseguiu 51 deputados.
Quanto aos verdes, com 4% dos votos, não obtiveram nem
um lugar no parlamento.
Também é de notar, que os Conservadores continuam
a ser um partido com a sua base no oeste, e nas áreas rurais
não tendo conseguido nem um deputado nas grandes cidades
do país como Toronto, Montreal e Vancouver – pelos
vistos nestas grandes metrópoles não compraram o
gato por lebre...
O que se perdeu
A propósito as grandes cidades, onde vive
a maioria da população do Canadá, com a derrota
do governo liberal perderam um subsídio que fazia parte
do programa do partido liberal, que os iria ajudar, especialmente
nas obras públicas. Prepare-se pois o leitor para mais
buracos na rua, a continuação da deterioração
dos transportes públicos e para pagar mais impostos a câmara
municipal. A propósito, quando entrar no autocarro e verificar
que ele já está velhote, pode ter como prémio
de consolação saber que o seu dinheiro irá
comprar mais tanques e aviões militares, uma vez que os
Conservadores vão gastar bastante com as formas armadas.
O plano liberal de assistência infantil para criar creches
e infantários em todo o país, prometido há
mais de dez anos, mas desta vez pronto para começar com
uma verba de 100 milhões anuais, vai desaparecer com o
novo governo conservador, que irá em vez disso dar um cheque
ao país de 1.200 dólares. Esse cheque, que tanto
irá para os ricos como para os pobres, não será
suficiente como disse um jornalista para pagar os cuidados de
um cão, num desses canis que existem hoje por todo o lado
ou como disse um comentador de forma muito verdadeira, mas politicamente
incorrecta para em muitos casos pagar a cerveja dos pais.
Como era de esperar, o governo conservador tenciona, seguindo
exemplo dos Estados Unidos, não participar no acordo de
Kyoto para a poluição da atmosfera, o que é
uma notícia trágica, na medida que as doenças
causadas pela má qualidade do ar, continuam a crescer,
e ainda hoje foi publicado um estudo que mostra que o número
de casos de asma nas crianças, aumentou de quatro vezes
nos últimos anos e que hoje uma em cada dez crianças
neste país sofrem desta doença. Interessante notar,
que o Sr. Harper sofreu de asma quando era criança.
Como todos os governos conservadores recentes, à semelhança
de Mike Harris na província do Ontário, iremos ver
cortes nos impostos – uma forma de comprar votos com o nosso
próprio dinheiro – pagos por cortes nos serviços
de saúde, sociais e educação. Por exemplo,
os conservadores vão cortar os subsídios propostos
pelo governo liberal, para ajudar a construção de
casas de rendas económicas, especialmente nas grandes cidades
como Toronto.
Claro que se o leitor pertencer àquela minoria, de pessoas,
que pagam impostor de muitas dezenas ou até centenas de
milhares de dólares, irá ter vantagens com a entrada
dos conservadores para o poder.
Finalmente, como se diz em inglês “the last but not
the least”(O último mas não o menos importante),temos
o problema da saúde, que infelizmente não teve grande
projecção durante a campanha eleitoral, perfeita
para os conservadores e cheias de erros para os liberais, a atenção
que merece. Todos sabemos que o Sr. Harper e os seus amigos do
oeste do Canadá especialmente nas províncias de
Alberta e Britsh Columbia têm grande interesse na medicina
privada, do que tem resultado o aparecimento de clínicas
privadas, usando vários subterfúgios que estão
a desviar recursos humanos técnicos, médicos e enfermeiras,
do sistema público para o da medicina comercial. Essas
clínicas, embora ilegais, segundo as leis que nos regem,
continuam a crescer como ervas daninhas e como me referi no último
artigo, estão a tentar penetrar no Ontário. Uma
vez que os conservadores não têm a maioria, apenas
124 deputados em 308, não serão capazes de mudar
a lei que nos rege, o Canada Health Act (Lei da Saúde do
Canadá), que torna ilegal a medicina privada porém,
como governo poderão tornar a lei menos eficaz, e lentamente
introduzirem a medicina privada a que eu gosto mais de chamar
pelo nome de comercial, uma vez que ela é destinada a produzir
lucros para os seus investidores.
Algumas coisas positivas
Nem tudo, felizmente foi negativo em relação
aos resultados das eleições que decorreram no dia
23 de Janeiro.
Para começar os conservadores com apenas 36,5% dos votos.
Só conseguiram 124 deputados, o que não lhes dá
a maioria num parlamento com 308 lugares. Desta maneira não
conseguirão passar nenhuma lei que seja realmente reaccionária
e prejudique o povo do Canadá, como seria a abolição
do Canadá Health Act que já me referi.
Embora o actual partido conservador, começando pelo seu
líder Stephen Harper, esteja recheado de gente da extrema-direita,
cuja ideologia é prejudicial aos interesses das classes
trabalhadoras do Canadá e, são contrárias
aos nossos sistemas de saúde e educação,
os três outros partidos, incluindo os separatistas do bloco
do Quebeque que é um partido de orientação
social-democrata, são progressistas e serão capazes
de bloquear qualquer lei retrógrada ou reaccionária.
Enquanto as coisas correram mal no resto do país, pode-se
afirmar que no Quebeque houve uma vitória para as forças
federais, isto é aquelas que são contra a separação
da província. Como é sabido a razão principal
para a derrota do governo liberal foi o famigerado “Escândalo
dos Patrocínios”ao qual já me referi várias
vezes, de que resultou na população do Quebeque
se sentir ofendida e votar contra o partido liberal, escolhendo
a única outra opção o Bloco Quebeque.
O Sr. Gilles Duccepe, líder dos separatistas aproveitou
a oportunidade, para afirmar que o seu partido que na última
eleição tinha obtido 48,9% de votos iria desta vez
passar os 50%, o que iria provar que a maioria da população
da Província era a favor da independência. Entretanto,
muitos cidadãos do Quebeque, aborrecidos com os liberais,
mas sem quererem votar pelos separatistas, resolveram votar pelo
partido conservador, seguindo uma velha tradição
desta província que é apoiar os vencedores, de foram
a terem alguém no governo que defensa os seus interesses.
Este facto e algumas concessões feitas por Stephen Harper
ao Quebeque, com as quais eu estou, pelo menos em parte, absolutamente
de acordo, levaram um bom número de habitantes desta província
a votar pelos conservadores, do que resultou que este partido
obtivesse 10 deputados e os liberais 14. Quanto ao partido separatista,
o Bloco Quebeque, que esperava passar dos 50% baixou para 43%,
embora dado o nosso estranho sistema eleitoral, ainda tivesse
obtido 50 lugares no parlamento.
O facto de os liberais, terem perdido mas não terem sido
pulverizados como sucedeu com a derrota de Kim Campbell, a sucessora
de Brian Mulroneuy, cujo partido conservador, ficou reduzido a
três deputados no Parlamento, é bastante positivo.
Esperemos que o tempo na oposição, venha a renovar
o partido liberal e a corrigir os erros do passado que permitiram
que o escândalo dos patrocínios tivesse acontecido.
O povo do Canadá necessita que o partido de Pearson e Trudeau
continue, uma vez que tem tido, e esperemos terá no futuro,
um papel importante a desempenhar no desenvolvimento do Canadá.
Também a subida para 29 lugares do NDP, que ao longo dos
anos tem sido “consciência do parlamento”sugerindo
inovações algumas vezes utópicas, mas com
frequência aproveitadas pelos outros partidos, é
um facto positivo da última eleição. Outra
boa notícia, foi a reeleição de Mário
Silva, que além de ter sido um excelente deputado, é
luso-canadiano de quem nos devemos orgulhar.
Finalmente, não devemos esquecer que estamos numa democracia
e embora sem dúvida esta eleição tivesse
sido ganha, usando o subterfúgio de nos “venderem
o gato por lebre”, isto é o partido conservador o
seu líder, nunca mostraram a sua verdadeira ideologia durante
a campanha eleitoral, pode-se afirmar quem teve mais votos é
que ganhou e que eles foram obtidos dentro das leis que nos regem.
Finalmente uma homenagem a Paul Martin, um homem que foi vitima
da sua honestidade e frontalidade. Ele que aliás foi ilibado
pelo inquérito do Juiz Gomery, em face ao escândalo,
procedeu duma forma correcta e honesta, tenho convocado um inquérito
para averiguar o que se tinha passado e evitado que semelhante
situação viesse a repetir-se. Outro primeiro-ministro,
poderia ter entregue apenas o caso à polícia, e
deixado o caso arrastar-se pelo tribunais. Poucos países
do mundo, e ainda menos primeiros-ministros, teriam a coragem
de Paul Martin ao enviar um caso como este para inquérito.
Diz-se que no Canadá, o povo nunca elege um governo, mas
sim deita abaixo o que está no poder. Pobre Paul Martin,
em vez de correrem com ele, deviam-lhe ter erguido uma estátua.
Quanto aos resultados da eleição, não foram
bons para o povo canadiano, especialmente para os trabalhadores
e os de condições mais modestas, mas poderiam ter
sido piores. Do mal, o menos – temos um governo conservador
mas em minoria.
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