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Por: Ferreira Moreno
Pela invulgar curiosidade de que se reveste,
passo a narrar a história da laranja de umbigo (navel,
em inglês), baseando-me nas informações que
encontrei na leitura do livro “Breviário da Bahia”(1945),
da autoria de Afranio Peixoto. Tive a boa fortuna em descobrir
que a história está devidamente certificada num
volumoso livro de 800 páginas, que há pouco adquiri
e cujo o título é precisamente “History of
Food.”
Afranio Peixoto afirma que a laranja de umbigo é originária
da Bahia. Em 1873 William Sanders enviou “duas pequenas
mudas de laranjeira” da Bahia p’rá sua amiga
Mrs. Elisa Tibbets em Washington. Uma delas segiu p’rá
Califórnia, onde foi plantada. Consequentemente, declara
Afranio Peixoto, “é da laranjeira baiana de Mrs.
Tibbets que procedem os laranjais da Califórnia, que hoje
dão aos Estados Unidos 100 milhões de dólares,
ou seja, metade do orçamento do Brasil.”
Claro, isto ocorria há mais de meio século, visto
que Peixoto visitou a Califorlândia em 1943, e teve a oportunidade
de ver e admirar a sua “septuagenária patrícia”ainda
a dar flores e frutos. Ao tempo, essa laranjeira encontrava-se
cercada por uma grade de bronze, a fim de protegê-la, e
localizada na Magnolia Avenue em Riverside, ao sul da Califórnia.
Em Maio de 1903 o Presidente Theodore Roosevelt plantou em Court
Glenwood Mssion Inn (Riverside) uma “filha recente”da
primitiva laranjeira.
Ambas estavam carregadas de frutos, provocando em Afranio Peixoto
“a ideia dessas belas mulheres fecundas que produzem, mãe
e filha, e as filhas e netas da Califórnia, já nasceram
nos Estados Unidos. Minha ternura foi p’rá minha
patrícia.”
E peixoto confessa: “Mirei-a e admirei-a. Li com embevecimento
a placa de bronze que o Ministério de Agricultura de Norte
América (United States Department of Agriculture) mandou
escrita: “This is the most valuable fruit introduction yet
made by the Department.” (A mais valiosa importação
de fruto jamais feita).
Portanto, no dizer de Peixoto, “o vegetal número
um da América do Norte é a laranjeira baiana de
Riverside na Califórnia.” Mais ainda, prossegue Peixoto,
“Que homem, nos Estados Unidos ou no mundo, já produziu
o que produziu essa árvore da Bahia? E isso, sem guerra,
sem revoluções, sem política, apenas florindo
e dando frutos, que são bênçãos e dois
milhões de contos, anualmente. E, pelas vitaminas e pelo
bom gosto, prazer e saúde de quanta gente! Bendita sejas,
laranjeira da Bahia!”
Maguelonne Toussaint-Samat, no seu livro “History of food”
(publicado em francês em 1987 e traduzido em inglês
em 1992 por Anthea Bell), embeleza a história da laranja
de umbigo nos seguintes termos:
“Um missionário chamado Schneider, a trabalhar na
Bahia (Brasil), enviou estacas da laranjeira a Horace Capon do
Ministério Americano da Agricultura. Capon plantou algumas
e ofereceu outras aos seus amigos Luther e Eliza Thibet, que as
trouxeram p’rá Califórnia onde as plantaram
e deram frutos.”
Na edição de 1973, revista e aumentada, do livro
“Califórnia, A Guide to the Golden State”,
somos informados que: “No ano de 1873 uma mulher de Riverside
obteve do Departamento de Agricultura (Washington) um par de estacas
duma curiosa variedade de laranja, importada do Brasil. Este tipo
de laranja era mais sumarento e não tinha pevides, e propagou-se
de forma extraordinária, alcançando tamanha popularidade
que os quinteiros viram-se obrigados a cercar as laranjeiras com
arame farpado, a fim de impedir os assaltos da ladroagem. A árvore
sobrevivente da originária laranja de umbigo encontra-se
na esquina das avenidas Magnolia e Arlington.”
Em complemento a esta série de informações,
transcrevo seguidamente os elementos recolhidos do meu favorito
“Historic Spots in California”, quinta edição
(2002) revista por Douglas Kyle:
“Num pequeno parque, entre as avenidas Magnolia e Arlington,
ergue-se um monumento à memória de Eliza Tibbets,
responsável pela produção das primeiras laranjas
de umbigo na Califórnia. À volta de 1873, o Professor
William Saunders tinha-lhe enviado de Washington umas amostras
de estacas recebidas da Bahia (Brasil). Destes “rebentos”
é que nasceu, no Sul da Califórnia, a grande indústria
da laranja de umbigo, que anualmente ajunta milhões de
dólares à economia do estado.”
Das duas primeiras laranjeiras, uma ainda existe protegida por
uma vedação. A outra, porém, transplantada
em 1903 p’ró pátio do hotel Mission Inn, com
a presença do Presidente Theodore Roosevelt, definhou-se
nos anos de 1920.
Fica assim corroborada a asserção de Afranio Peixoto
apontando ser de origem baiana a deliciosa laranja de umbigo,
que ora enriquece e aromatiza a Califorlândia!
E agora, numa saudação especial p’ró
Tenente-Coronel Rui Lopes, aposentado em Algés, eis uma
dezena de quadras extraídas do Cancioneiro Popular Transmontano
& Alto-Duriense de Guilherme Felgueiras. Ao meu bom amigo
Rui Lopes, que serviu uma comissão militar em S. Miguel
dos Açores, durante a Segunda Guerra Mundial, devo a cópia
do cancioneiro.
Tendes laranjeiras à porta,
Tendes sombra perfumada;
Tendes fama de bonita
E de feia não tens nada!
Dá-me da pêra metade,
Da maçã um bocadinho
Da laranja um só gomo,
Da tua boca um beijinho.
Dá-me da pêra um cacho,
Da maçã uma talhada,
Da laranja um gomo,
Do limão pouco ou nada.
A laranja redondinha
Cabe dentro do limão;
Também, vós, minha menina,
Cabeis no meu coração.
Quando te vi, laranjeira,
De laranjas carregada,
Logo meu coração disse:
Laranjeira desgraça!
Menina das laranjinhas,
Quantas dá por um vintém?
Dou uma a quem me dá duas,
Dou três a quem me quer bem.
Tenho uma laranja doce
Ao canto do meu baú,
P’ra dar ao meu amor
Queira Deus que sejas tu!
A laranja de madura
Caiu ao fundo do tanque;
Quem aqui vem de tão longe
Já te tem amor bastante!
A laranja quando nasce
O rouxinol a namora,
Anda de folha em folha,
Dá-lhe um beijo, vai-se embora.
Da laranja quero um gomo,
Do limão quero um pedaço:
Da menina mais bonita
Quero um beijo e um abraço.
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