Vasco Oswaldo Santos


Sentirão eles um remorso igual ao meu?

O dia de hoje é para esquecer e ainda mal começou...

Tudo isto porque há algumas semanas que a máquina de secar secava pouco. O escape para o exterior parecia entupido. A roupa saía húmida e tinha de voltar para outro ciclo inútil. O gasto de energia e o calor dentro de casa eram incomportáveis.

Os técnicos de ventilação chegaram quando eu me preparava para ir trabalhar. Fiquei a ajudar, meio incompetente no meio do quintal, a olhar alarvemente para o escape externo, sem saber o que fazer. O veredicto veio rapidinho do topo da escada: - É um ninho, Senhor Oswaldo! – Eu bem me farto de dizer ao moço que Sr. Oswaldo é o meu pai. Mas ele insiste. Que raio, é da idade da minha filha mais nova, um luso-canadiano bem-educado a quem os pais deram chá a beber em pequenino. Ele nem se apercebe – nem tem que – que o tratamento me recorda a condição de sexagenário relutante.

Bom, o que fazer? Nesta altura, o rapaz grita porque a mãe avezinha sai de rompante e bica-lhe o dedo antes de se perder no cinzento do céu, bem menos cinzento que o cinzentão da minha angústia.

Pode tirar-se o ninho sem estragar? Ele disse que sim. Pouco depois, nas suas mãos, estava um leito perfeito que a natureza dos passarinhos havia habilmente tecido de palhinhas, cotão e penas (de todos os tipos, mesmo as da alma). No meio, três lindos ovinhos pintalgados...

Perguntei se valeria a pena metê-los na protecção de uma caixa de cartão e deixá-los ali no ninho para o eventual regresso da mãe. Que não, disse o jovem, que não valia a pena. Seriam abandonados... mas ele teria muito gosto em os levar para casa e tentar chocar artificialmente. Senti-me melhor depois de dizer que sim.

Eles já foram embora com o ninho. O cano está limpo, a máquina funciona bem, a rede protectora fica a impedir novas construções.

Cá por dentro, lembro os bulldozers israelitas a demolirem as casas dos palestinianos em retaliação (?) da luta destes pela liberdade. Tal como o jovem operário, os soldados obedecem (?) a ordens. Mas os mandadores que decidem a demolição, terão pruridos de consciência como eu tenho? Mandei destruir um lar (ninho, berço, abrigo, e tudo o mais). Magoei o coração de uma mãe, mesmo ave. Pus em risco o medrar de três vidas pequeninas. Merda! Qual a diferença entre mim e um político do Knesset?

Espero, insisto, que apenas a dor que me vai pela alma. Os israelitas, não poderão sentir nada disto. Porque não acredito que ainda tenham alma, depois do que têm feito desde 1948.