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Por: Ferreira Moreno
Ao espírito empreendedor do missionário
franciscano espanhol Padre Junipero Serra (1713 – 1784),
a Califorlândia ficou a dever o estabelecimento das seguintes
Missões:
San Diego de Alcalá (1769), San Carlos Borromeo de Carmelo
(1770), San Gabriel Arcángel (1771), San Antonio de Padua
(1771), San Luis Obispo de Tolosa (1772), San Juan Capistrano
(1776), San Francisco de Assis (1776), Santa Clara de Assis (1777),
e San Buenaventura (1782).
Decorria, pois, esse distante ano de 1782, e o entusiasmo pela
expansão de novas Missões persistia ainda no coração
do Padre Serra, por isso, quando o Governador Felipe de Neve (1728
– 1784) determinou construir um Presídio, ou Forte,
em Santa Barbara em 1782, Serra acompanhou a expedição
militar, celebrando Missa após ter benzido a localidade
demarcada com uma cruz de madeira.
Os soldados, de imediato deram início ao levantamento do
reduto militar, incluindo as respectivas barracas e uma capela,
Serra, por seu turno, antecipando a autorização
do governador, entregou-se aos preparativos p’ra fundar
outra Missão ali perto, mas teve de retirar-se, desgostoso,
devido à oposição do governador.
É certo que Junipero Serra visitou, por duas vezes, o Presídio
de Santa Barbara em 1783, mas viria a falecer em 1784, e só
em 1786 é que teria lugar a fundação da Missão
de Santa Barbara, sob a presidência do seu sucessor Padre
Fermin Lasuén (1720 – 1803).
A primeira festividade do Natal em Santa Barbara ocorreu precisamente
em Dezembro de 1782, perante a admiração e perplexidade
dos Índios, atraídos pelo desenrolar incompreensível
de tantas curiosidades.
Claro que, a esse tempo, não era ainda tradição
corrente o uso de árvores de Natal (enfeitadas e iluminadas).
Com “montes” de presentes distribuídos por
Santa Claus...
No entanto, os soldados e seus familiares, armados de tochas,
organizaram a cerimónia “Las Posadas” com o
cortejo tradicional representando Maria, sentada num burro, acompanhada
por José e o Anjo, batendo às portas a pedir alojamento.
Os participantes animavam o trajecto processional com cânticos,
e por fim reuniam-se p’rá festiva partilha dos doces
e “knick-knacks”contidos numa bilha de barro chamada
“Pinata.”
Nesse distante ano de 1782, houve também Missa de Natal,
foi celebrada por um padre franciscano, vindo de mula, da vizinha
Missão de San Buenaventura!
Da Califorlândia vamos agora aos “Açores dos
meus Amores”, a fim de fornecer uma referência de
Natal ao notável contista Padre Francisco Nunes da Rosa
(1870 – 1946), cujos livros “Pastorais do Mosteiro”e
“Gente das Ilhas” guardo ciosamente e leio religiosamente.
Nunes da Rosa nasceu ao 22 de Fevereiro de 1870 em Rio Vista,
no condado ou concelho de Solano da Califorlândia, Os pais
eram da Madalena, ilha do Pico, p’ra onde retornaram levando
o filho ainda criança. Depois de frequentar o Liceu da
Horta e o Seminário d’Angra, Nunes da Rosa foi ordenado
sacerdote em 1893, tendo paroquiado na freguesia do Mosteiro,
ilha das Flores, e seguidamente (1896) na freguesia das Bandeiras,
ilha do Pico, onde faleceu aos 13 de Setembro de 1946.
Em forma da narrativa ligeira, vou “transpor” p’ra
esta crónica um conto de Nunes da Rosa, relembrando um
Natal distante ocorrido algures nas saudosas ilhas dispersas no
atlântico oceano.
Trata-se dum casal de velhotes, o tio Luís e a tia Rosa,
a falar de coisas do Natal, de quando eram novos. A noite ia fria
e escura, cortada de rajadas de vento e de bátegas d’água,
quando na torre da igreja os sinos começaram a repicar
p’rá Missa do Galo.
Os dois velhinhos aprontaram-se com vagar e dificuldade, mas não
tiveram coragem em sair à rua. Careciam de saúde
necessária p’ra se encaminharem até à
igreja, palidamente iluminada lá adiante. E como os olhos
marejados de lágrimas, recolheram-se silenciosos ao quarto,
escutando novamente os repiques dos sinos.
O casal ainda tentou, uma vez mais, sair p’rá igreja,
ao ver passar magotes de pessoas, caminhando ruidosas e iluminando
com lanternas o piso áspero e escuro do caminho lamacento.
Novamente, os velhinhos detiveram-se, indecisos, no balcão.
E ali ajoelharam, nas pedras alagadas, diante da grandeza do quadro
daquela Noite Santa, sob a abóbada escura do céu,
à luz das estrelas, com as mãos vacilantes erguidas
p’rá Cruz, enquanto os sinos festivamente ecoavam
nos ares os sons, alegres e cantantes, do “Gloria in excelsis
Deo” entoado na igreja iluminada lá adiante.
P’ró tio Luís e p’rá tia Rosa,
foi esta a sua derradeira Noite de Natal.
Este conto, intitulado “Vencidos”, encontra-se no
livro “Gente das Ilhas.”
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