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Por: Ferreira Moreno
Na liturgia católica a Semana Santa tem
início no Domingo da Paixão, mas conhecido por Domingo
de Ramos (Palm Sunday, em inglês), quando os fiéis
se reúnem nas respectivas igrejas p’rá distribuição
de ramos de oliveira ou de palmeira, a que se segue uma procissão,
adentro da mesma igreja ou á volta dela, numa singela mas
significativa comemoração da entrada triunfal de
Jesus em Jerusalém.
Antigamente, nas ilhas dos Açores, os sinos repicavam numa
associação festiva á celebração
deste Domingo de Ramos, e era com intensa alegria que as gentes
das ilhas levavam p’ra casa as palmas benzidas na Igreja.
Havia quem, simplesmente, guardava essas palmas como uma espécie
de talismã, confiando que as mesmas serviriam p’ra
proteger as pessoas, os animais e outras coisas, contra qualquer
categoria de adversidade.
Havia, também, quem se dava ao cuidado de atar tais palmas
em forma de cruz, colocando-as quer em canas que em paus, que
depois se erguiam pelos campos das searas, nos alto das árvores
de fruta em quintas e quintais, bem como em frente as casas. Dest’arte
as palmas bentas tinham (por assim dizer) a missão de defender
as propriedades (de cada qual) contra vários malefícios,
tais como esses providos do “mau olhado”.
Mais ainda, havia igualmente a crença em queimar estas
palmas bentas e guardar as cinzas em casa, como protecção
em caso de trovoadas. ( Carreiro da Costa, Tradições,
Costumes & Turismo, 20/abril/74).
Fui a jardim colher palmas
Encher o meu arregaço;
Agora daqui não passo.
Eu fui ao jardim ás palmas,
Apanhei as que escolhi,
Só me faltou um suspiro
Que dera quando te vi.
Adeus, jardins das palmas!
Ó meu lindo amor-perfeito,
Quando alguém te procurar,
Seja dentro do meu peito.
Fui ao campo colher palmas,
Conchinhas à beira-mar;
Esses teus olhos, menina,
Ai! amor, são de enganar.
Ó menina, não me deixes,
Que ainda te não deixei;
No jardim de tantas palmas,
Não sei qual apanharei.
Eu fui ao jardim ás palmas,
Não achei senão palmitos;
Quem casa com mulher cabra,
Nunca tem senão cabritos.
Ás solenes hossanas do Domingo de Ramos
seguem-se as efusivas aleluias do Domingo de Páscoa, com
os repiques dos sinos anunciando a ressurreição
de Jesus. As igrejas abrem-se em claridades de velas e círios
de entremeio com a fragrância de flores em profusão
enquanto os foguetes entram a estalar pelos espaços!
E no aconchego das casas, a portas dentro, há fartura de
amêndoas e confeitos. Espreitando dentre os guardanapos,
de rendas e bordados. Vêem-se os folares a sorrir, (numa
expressão de Carreiro da Costa), “com suas faces
coradas de louras côdeas e aqueles olhos misteriosos dos
seus ovos!”
Além dos perfumes que se espalham pelos campos e se derramam
por ruas e canadas, por casas e quintais, aquilo que ainda agora
me acode à memória e baila em meu coração
de emigrante, é, sem dúvida alguma, a presença
de flores sem conta nesta quadra pascal.
De facto, as flores aparecem por toda a parte em aleluias extraordinárias
de beleza, formando um carrossel de mil cores e aromas. Há
flores nos altares e andores, em janelas e balcões. Há
flores atapetando os caminhos e estendendo-se pelos muros.
Confesso com a mais profunda nostalgia que, apesar da distância,
parece-me estar a ver novamente, nesta primavera pascal, as nossas
saudosas ilhas transformadas em autênticos jardins floridos!
Dentro em meu peito tenho
Um cacho de rosas brancas
P’ra desfolhar mais tu
Qu’as saudades já são tantas.
O meu peito é um jardim,
Meu coração um canteiro;
Eu mesmo rego as flores,
Eu mesmo sou jardineiro.
Quatro flores em meu peito
Fizeram sociedade:
Alecrim, amor-perfeito,
Rosa branca, saudade.
Viva o cravo, viva a rosa,
Alecrim, o amor-perfeito;
Viva a minha flor mimosa
Aqui dentro do meu peito.
Dizem que a rosa é bela
E a violeta formosa;
Mas p’ra mim a Saudade
De todas é mais bela.
Açucena é uma flor
Das que se poem no altar;
Nunca pus nem hei-de pôr
Outra flor no teu lugar.
Ó minha linda menina,
Ó minha rosa em botão:
Nesses teus olhos azuis
Navega meu coração.
As rosas, que tens no rosto,
Não são c’mas outras, não;
As tuas colhem-se à mão.
Rosa, que estás na roseira,
Deixa-te estar sossegada;
Mas vale ser solteira,
Do que te ver mal-casada.
Eu plantei e não pegou
Lírio roxo na estrada;
Tua feição é morena,
Morena mas engraçada.
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