A Respeito dum Regresso


Por Ferreira Moreno

Escrevi, recentemente, uma crónica acerca dum livro que tinha por título “Pelas Estradas dos Açores”, da autoria do continental Vasco Callixto, mas cuja publicação havia ocorrido no já distante ano de 1973, ou seja, parcialmente desactualizado e ultrapassado pela vaga de progresso presenciada nas ilhas nas últimas três décadas.
Desconhecia, no entanto, que neste intervalo de tempo Vasco Callixto havia-se deslocado novamente às ilhas em 1999 (S. Miguel e Terceira); em 2000 (Graciosa, S. Jorge, Pico e Faial); e em 2001 (Santa Maria, S. Miguel, Flores e Corvo), agrupando as memórias destas excursões num esbelto livro publicado no ano de 2002 ao título “Regresso aos Açores.”
Porem, só agora é que este livro, por feliz acaso, veio parar-me às mãos. Confesso que o li com redobrado interesse e nostalgia. Desde já, e desta longínqua Califorlândia, apresento ao autor sinceros parabéns e o eco da minha saudosa gratidão.
Começando por Ponta Delgada, “sempre airosa e mais movimentada”, este regresso às nove ilhas atlânticas teve a magia de, uma vez mais, maravilhar o autor com a extraordinária beleza dos Açores, historicidade insular e hospitalidade da população local.
Vila Franca do Campo, vista do miradouro de Nossa Senhora da Paz, constitui um “soberbo panorama de terra e mar”, enriquecido pela proximidade do Ilhéu servindo-lhe de sentinela.
A Ribeira Grande, “onde o passado alia-se harmoniosamente ao presente”, permitiu ao autor evocar a memória do historiador Gaspar Frutoso, que ali escreveu as “Saudades da Terra.”
A bordo do navio “Golfinho Azul”, o autor viajou até a ilha Terceira, apreciando e vivendo, “com inteiro agrado, o fascínio do mar dos Açores”, desembarcando na histórica Praia da Vitória, “uma cidade de simpática feição, enquadrada numa óptima paisagística”, dispondo de “um porto excelente, uma bela baía e uma extensa praia.”
Depois de identificar a localidade como “berço natal” de Vitorino Nemésio (1901-78), o autor dirigiu-se à baía da Salga, “sítio de tranquila e atraente beleza paisagística, onde se desdobra uma emotiva página da História de Portugal.”
A referência indica, evidentemente, aquela pirâmide de pedra negra, que ali se levanta e ostenta uma placa com os seguintes dizeres: “Ao valor dos terceirenses que em luta heróica aqui venceram e expulsaram o invasor estrangeiro no dia 25 de Julho de 1581.”
Já em Angra do Heroísmo, após uma “volta”pelo arborizado Monte Brasil, encimado pelo “Padrão”no Pico das Cruzinhas e resguardado pelas muralhas do “Castelo”de S. João Baptista, o autor subiu ao alto da “Memória”, onde se ergue “uma imponente e bem ornamentada pirâmide”, descendo em seguida p’ró Jardim Duque da Terceira.
Vasco Callixto, ao deambular pela ruas d’Angra. Teve a oportunidade de apreciar o seu “característico, harmonioso e secular traçado urbanístico”, e bem assim, “os antigos e nobres edifícios, as varandas corridas, os velhos beiras e os oratórios floridos”, não esquecendo a Sé Catedral, a Igreja da Misericórdia e a do Colégio.”
Na Graciosa, o autor declara que “as estradas da ilha, quase todas alcatroadas, percorrem-se com prazer; as povoações apresentam-se de simpática feição, e a paisagem, enriquecida por típicos moinhos de vento, é bem digna de ser contemplada. “Admirando, por toda a parte, “vinhedos e matas verdejantes, paisagens de tranquila e suave beleza”, o autor subiu ao Monte de Nossa Senhora da Ajuda, visitou as modelares instalações das apreciadas Termas do Carapacho, e alinhavou o devido comentário “àquele fantástico e extraordinário mundo subterrâneo” popularmente conhecido por “Furna do Enxofre.”
S. Jorge, “excelente terra pastoril e de uma beleza deveras fascinante”, possuiu estradas que permitem alcançar sítios de onde se contemplam admiráveis panorâmicas. É uma ilha montanhosa, com costas altíssimas cobertas de densa vegetação, formando-se junto ao mar pequenas planuras chamadas “fajãs”, apresentando ainda abundantes cursos de água que se despenham de grande altura. Existem igualmente extensos pomares, vinhedos e inhamais.
No Pico, foi a montanha do Pico, “aquela elevação vulcânica apontada ao céu”, que deixou o autor “preso à sua imagem invulgar, soberba e cativante.”Na ilha do Pico, as povoações estendem-se ao longo do litoral, “todo o vasto interior é desabitado. “Referência especial é feita ao Museu dos Baleeiros, “único do género em Portugal.”
Em meia-hora, o “Cruzeiro do Canal”transportou o autor da ilha do Pico p’rá ilha do Faial e reencontro com a Horta, “a cidade de mais belas panorâmicas dos Açores.” Cidade de Tradições liberais e riqueza monumental, a Horta dispõe duma atractiva área portuária e do mundialmente conhecido “Peter’s Café Sport”, a que devemos acrescentar o espectáculo ainda patente na região dos Capelinhos, mais a visão da grandiosa Caldeira.
A visita a Santa Maria, a primeira ilha dos Açores a ser descoberta no começo do segundo quartel do século XV, teve início na Vila do Porto e prosseguiu numa rede de estradas asfaltadas, em bom estado, com boa sinalização orientadora e identificadora das localidades, aliando perfeitamente a História ao turismo.
Novamente em S. Miguel, o autor aproveitou a oportunidade p’ra percorrer a costa norte micaelense e seguir em romaria até o Concelho do Nordeste, que o deixou encantado perante inúmeras paisagens de impressionante e tranquila beleza e de grande panorâmica, “onde as povoações mantêm o pitoresco de outrora e têm situações excepcionais.”
Depois da obrigatória paragem nos miradouros das Pontas do Arnel, do Sossego e da Madrugada, o autor tomou o caminho p’ró Concelho da Povoação, extasiando-se com a vista do ramal p’ró Faial da Terra, “um panorama presépio inesquecível, com altas falésias descendo até o mar e, lá nas profundezas, um encantador povoado espalhado em volta da sua igreja branca.”
Rodeada por sete lombas, separadas por pronunciadas ravinas, e espraíando-se à beira-mar, a vila Povoação exude história e turismo e a paisagística e admirável. Segue-se daqui p’ró maravilhoso vale das Furnas, um dos maiores cartazes do turismo açoriano, com sua romântica lagoa, fumegantes “caldeiras” e extraordinária vegetação.
Uma vez mais a bordo do “Golfinho Azul”, o autor tomou o rumo à ilha das Flores, onde “toda as paisagens são dominadas por encostas desta ilha é um desbobinar constante das mais fascinantes imagens. Devido ao grande número de quedas de água, diz-se que a ilha das Flores dá de beber ao mar.”
Daqui, “por via aérea”, o autor passou à ilha do Corvo, onde se demorou por três dias.
Em contraste com a visita feita em 1972, quando não havia automóveis, desta vez encontrou cerca duma centena. “O Corvo mudou, mas mantem o seu fascínio de paraíso terreno, que nos leva a desejar permanecer longamente a fim de descobrir todos os seus segredos.”
O livro encontra-se extensivamente ilustrado com fotogravura e apresenta um vasto rol de referências históricas de grande proveito p’rós estudiosos, cuja transcrição excederia o espaço limitado a esta ligeira crónica. Recomendo a leitura de “Regresso aos Açores.”