A Respeito das Lendas Açorianas


Por Ferreira Moreno

Na sua preciosa série "Tradições, Costumes & Turismo", o saudoso Dr. Carreiro da Costa (1913-81) incluiu um artigo que ora me apraz recordar, e que saiu publicado no "Açoriano Oriental" (então semanário dirigido pelo Dr. Lobato de Macedo) na respectiva edição do fim-de-semana de Sábado dia 1 de Dezembro de 1973…há já trinta anos!

Servindo-se do título "Para um inventário das lendas açorianas", Carreiro da Costa apelava p'ra uma recolha metódica das lendas relacionadas com os Açores e originadas nessas dispersas ilhas atlânticas, determinando assim aspectos, quer históricos quer fictícios, atribuídos a tais lendas no desenrolar de acontecimentos ocorridos no decurso dos séculos.

Evidentemente que este processo de recolha necessitava um inventário das origens do Arquipélago, sobretudo no que diz respeito à formação vulcânica das ilhas. Embora o vulcanismo constitua uma realidade perfeitamente demonstrada, o certo é que o nosso povo ainda hoje "sonha" com a lendária Atlântida, e na poeira do seu isolamento vislumbra a aparição de grande gigantes que, vindos longe, ter-se-iam petrificado nas cristas do oceano.

Seguidamente, como acentua Carreiro da Costa, temos o ciclo do descobrimento das ilhas oferecendo um fascinante leque de lendas abrindo-se em capítulos repletos de episódios a transbordar mistério, poesia e drama.

Reveste-se de particular interesse a exploração das ilhas encontradas, das belezas que nelas abundavam, dos povos que dos cataclismos que as acometeram em épocas e evoluções, que ultrapassam as raias da imaginação.

Inesquecíveis, sem dúvida alguma, os ataques perpetrados por corsários e piratas que, igualmente, deram azo a narrativas lendárias ainda hoje embebidas em nostalgia, mas ilustrando exemplarmente o rol de perigos enfrentados pelos insulanos.

Dignas de referência as lendas acerca de enseadas e fajãs, montes e vales, igrejas e ermidas, bem como descrições fabulosas de imagens milagrosas, não esquecendo conventos e mosteiros, casas assombradas e encruzilhadas tenebrosas. A origem de certas árvores e animais integra-se, também, no folclore lendário e religioso das ilhas. E na opinião de Carreiro da Costa, o ciclo da baleia nos Açores constitui, só por si, um vasto capítulo de "estórias" e de lendas.

Devido à abundância de casos ocorridos e variedades de notícias transmitidas, o culto do Divino Espírito Santo presta-se adequadamente a uma recolha extraordinária de lendas emocionantes e curiosidades pitorescas.

O apelo de Carreiro da Costa p'ra um possível inventário das lendas açorianas termina com a seguinte mensagem: "Assim haja quem se entregue a tão aliciante como urgente tarefa."

Apraz-me agora revelar que este apelo e mensagem foram concretizados, finalmente, com a publicação do livro AÇORES, LENDAS & OUTRAS HISTÓRIAS, com mais de duas centenas de "títulos" devidamente distribuídos pelas noves ilhas do arquipélago.

Este trabalho, que considero um tesouro da maior estimação, é da inteira responsabilidade da professora picoense D. Ângela Furtado-Brum, natural da Calheta do Nesquim onde nasceu em 1952. É certo que muitos alunos de escola de todas as ilhas colaboram na realização deste projecto, mas o crédito na recolha e arranjo dos textos vai inteirinho p'ra ilustre professora.

Tive a felicidade de adquirir o livro (segunda edição, Dezembro 1999) quando o Bernie Ferreira, como já é tradição, me proporcionou nova "boleia" aos Açores através da "California Suntrips".

Ora aconteceu que, no ano 2001, um jornal de Winnipeg (Canadá) entrou a publicar uma série de pseudo-artigos com a assinatura e foto dum professor (?) de nome Armando Santos, versando lendas açorianas. Porém, o estilo da composição fez-me desconfiar que ali havia aldrabice, dado o paralelismo com as obras originais de, entre outros, Armando Monteiro da Câmara Pereira e Teotónio Machado de Andrade. Mas pouco depois, com a aquisição do supracitado livro de Ângela Furtado-Brum, verifiquei que o indivíduo era um desavergonhado plagiário ipsis verbis os textos publicados em "Açores, Lendas & Outras Histórias", sem nunca usar da cortesia em dar o devido crédito ás "fontes de origem."

De imediato, informei a redacção do jornal àcerca da situação do fraudulento colaborador. Em troca e compensação, cessaram o envio do jornal e amortalharam a publicação das minhas crónicas…

Pois Alevá!