A FÁBRICA DA BALEIA DAS LAJES DO PICO
Por: Paulo Luís
Ávila
Adiaspora.com
O Portinho e a rampa
A fábrica da baleia das Lajes, foi instalada
no lugar do Portinho, (foto acima). Vem-me à memória
o primeiro dia em que vi uma baleia na rampa de varagem no
Caneiro, na lagoa, onde existiam quatro (?) traióis,
(uns dizem que eram cinco), mas não interessa o número
correcto, porque foram as primeiras fábricas de transformação
de cetáceos existentes na Vila Baleeira. Outras iguais
às que existiam na ponta do muro do Caneiro, também
exerciam a mesma função por esse Pico além
como era o caso na Calheta de Nesquim e no Cais do Pico, provavelmente
também as haveria em São Mateus, Santo Amaro,
Santa Cruz e Prainha, mas não tenho dados históricos
para poder dar essa certeza. Um dia pela mão de meu
Padrinho, fui com ele até ao Caneiro para ver uma grande
quantidade de cetáceos que as catorze canoas ao tempo,
que arriavam no porto das Lajes, tinham capturado. Sei que
me fez muita confusão, como é que um homem tão
pequenino, sozinho, tinha matado um monstro daqueles e no
mar. Entre esse período e o do começo da construção
da Fábrica.
Vista Geral da Fábrica da Baleia
A fábrica da baleia, foi uma iniciativa das armações
das Lajes, das Ribeiras e do Topo em São Jorge, que
ergueram as paredes daquele enorme e sólido imóvel,
uma vez que as armações da Calheta de Nesquim
por influências extra-concelhias não quiseram
participar. O primeiro encontro para se falar sobre aquele
assunto e o como se deveria proceder para a constituição
da futura sociedade, teve lugar na sala da Câmara Municipal
e lá compareceram todos os gerentes e sócios
(alguns) das companhias e, nessa altura foi redigida a minuta
da Escritura. Era notário ao tempo o Dr. Barroso. Assim
aquela sociedade tomou o nome de Sociedade da Indústria
Baleeira Insular L.da., SIBIL, tendo sido nomeados primeiros
gerentes, Manuel Rodrigues Quaresma Júnior, Francisco
Moniz de Melo e Ermelindo dos Santos Machado Ávila.
Em finais dos anos quarenta começaram a ser erguidas
as paredes, mas a dado momento não houve mais capital
e a obra foi suspensa. Estava nessa altura atento à
situação um empresário de Lisboa de nome
Virgílio Correia, que comprou cinquenta e um por cento
das quotas, conjuntamente com outro sócio minoritário,
Joaquim Brum e a obra foi concluída. O primeiro cachalote
que lá foi laborado, foi amarrado e puxado pelos dois
guinchos e muitos foram os curiosos que assistiram àquele
acontecimento, o primeiro de muitos que ocorreram naquele
local. Lembro-me também, porque assisti e recordo a
azáfama do Sr. Arnaldo Silva, que era o capataz e do
Sr. Quaresma, o gerente da fábrica, que dum lado para
o outro, muito nervosos, andavam afastando as pessoas, com
medo de que os cabos de aço, onde numa das ponta estava
amarrada o rabo da baleia e na outra a força motriz
dos guinchos, rebentassem e fossem ferir gravemente alguém.
Sei de fotos realizadas nessa altura, mas com o andar dos
tempos deterioraram-se, o que é de lamentar. Entretanto
já havia sido contratado em Setúbal, para onde
tinha ido trabalhar, o que ficou depois como encarregado da
fabricação do óleo e das farinhas, António
Lourenço (o Sr. Flores, como era conhecido), de saudosa
memória. Era um trabalhador incansável e desdobrava-se
em várias tarefas, tanto como técnico ou como
encarregado de amarrar as baleias fundeadas no Portinho e
a trazer o cabo de aço era transportando-o para terra
num frágil batel. Uma vez, um tubarão assustou-o
de tal modo que, ao ver a sua vida em perigo, fez uma promessa,
que cumpriu, ao Divino Espírito Santo. O facto de ter
casado com uma Lajense, Evangelina Soares (Sertório),
influenciou-o sobremaneira e contribuiu para a sua vinda para
as Lajes, onde viveu muitos anos numa casa que se encontra
hoje em ruínas, mesmo ao lado da Fábrica. Mais
tarde construiu a sua própria moradia. Com o declínio
da caça à baleia emigrou para os Estados Unidos,
onde veio recentemente a falecer, com mais de oitenta anos,
mas quando um dia o visitei na sua casa em New Bedford e lhe
falei dos tempos passados nas Lajes e da Fábrica, os
olhos pareciam que lançavam chispas e o rosto resplandeceu
de intensa saudade.
O interior
Autoclaves
Muitas histórias então me foram
contadas...umas boas e outras menos boas. Foi ele que deu
nome aos produtos que daqui saíam, pela alta qualidade
da sua fabricação. É uma homenagem justa
que aqui deixo, porque destes homens a história esquece-se
rapidamente. Mas tudo tem um fim e certo Domingo, em que se
procediam aos preparativos para trazer para a plataforma da
fábrica, mais um cachalote, a caldeira explodiu, em
circunstâncias estranhas e colheu mortalmente o fogueiro
Manuel Ávila, filho dum dos mais célebres baleeiros
que passaram pelo Porto Lajense, Gil de Brum Ávila.
A partir daí e como era quase impossível proceder-se
ao restauro da mesma ou à sua substituição,
porque isso implicaria o desmoronamento de paredes e os custos
não compensavam os lucros subsequentes, as baleias
caçadas neste porto e no das Ribeiras passaram a ser
laboradas em São Roque, na Fábrica do Cais,
hoje Museu da Indústria Baleeira, até à
total proibição da captura dos cetáceos.
Mas essa total proibição só atingiu os
países considerados pobres, porque os industrializados,
como é o caso da Noruega e do Japão, continuam
caçando indiscriminadamente cetáceos e não
ouço qualquer referência a este facto por parte
dos ambientalistas mais fanáticos. Entretanto, a Fábrica
foi vendida a um indivíduo do Continente, passou a
ser Gerente o Professor Manuel Moniz Bettencourt e foi dirigida
para outro ramo de actividade mas, por falta de pagamentos
à fazenda nacional, foi a mesma vendida em hasta pública
e, mais tarde, adquirida pela Câmara Municipal das Lajes
que a utilizava até há bem pouco tempo para
armazém. Hoje, o seu restauro foi adjudicado a uma
firma picoense. O edifício servirá para fins
culturais, preservando-se o que ainda resta do material da
antiga laboração existente.
Interior
A chaminé
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