CINCO DÉCADAS DE RAÍZES AÇORIANAS
NA CASA DOS AÇORES DE TORONTO
(Toronto, 2 a 8 de Novembro de 2003)
Por Carlos Morgadinho-Adiaspora.com
Foi a temática escolhida para a VII Semana
Cultural Açoriana organizada pela Casa dos Açores
de Toronto e que decorreu entre os dias 2 a 8 de Novembro. A abertura
oficial deste evento teve lugar na Sede Social daquela Casa Cultural,
pelas 17:00 horas do dia 2 de Novembro de 2003, Domingo, e que
contou com a presença de muitos sócios, seus familiares
e amigos daquela colectividade. Este dia foi dedicado à
Ilha do Pico sendo enriquecida com a presença e intervenção
de um nativo daquele Concelho, hoje desempenhando as funções
de Presidente da Câmara das Lajes do Pico, Engenheiro Cláudio
José Gomes Lopes, que se deslocou a Toronto propositadamente
para abrilhantar o programa desta Semana Cultural.
No âmbito deste tema foi passado um excelente
e interessante vídeo intitulado "Concelho das Lajes
do Pico - Recanto de Baleeiros" seguido de uma palestra daquele
autarca que finalizou saudando todos os naturais dos Açores,
mais particularmente, aos pioneiros imigrantes oriundos daquela
Ilha Açoriana. No início destas festividades procedeu-se
à entoação dos hinos do Canadá, Portugal
e dos Açores enquanto as respectivas bandeiras eram desfraldadas
pelos Srs. Luís Carlos Moniz (Pres. da A.G. da Casa dos
Açores), Dr. Artur Magalhães (Cônsul Geral
de Portugal em Toronto) e Leonel Machado (Director da Juventude).
Foram apresentadas as saudações aos convidados de
honra e a todos os presentes pelos Presidentes da Assembleia-Geral
e Direcção daquela Casa Regional, Luís C.
Moniz e Fernando Faria, respectivamente.
Durante estes dias de cultura nesta Casa, as sessões abriam
sempre com uma lindíssima declamação com
música de Nuno Miller e letra do poeta, escritor, autor
teatral e colunista do semanário Nove Ilhas de Toronto,
José Pereira, que, segundo pudemos testemunhar, fez correr
lágrimas nos rostos de muitos dos presentes. Esta letra,
de uma nostalgia bem vincada e de uma tristeza sem limites, em
muito nos sensibiliza só em escutá-la, mas só
nós, imigrantes, que um dia partimos para longe da nossa
terra natal, dos entes queridos e amigos, a podemos sentir verdadeiramente.
Foi, segundo o seu autor atrás mencionado, escrita há
mais de vinte e cinco anos, quando, ele também, um dia,
resolveu deixar a sua Pátria bem amada e emigrar para o
Canadá. Pela sua originalidade e beleza não resistimos
à ideia de a inserir nesta nossa crónica:
Partida
O sol entrava pela janela
Bateu-lhe nos olhos,
Abriu-os.
Seria o último dia que veria o cantar do galo
O mugir dos bois.
Ia partir!
A mulher andava pela casa
Caminhava sem pressa,
Queria parar o tempo
Mas o tempo não parava,
O tempo corria
Corria cada vez mais,
A hora ia chegar!
O coração doía-lhe,
Os olhos estavam vermelhos,
Já não dormia há tanto tempo!
Ai o tempo, o seu inimigo.
Aproximava-se a hora da partida
O povo da aldeia viera para as portas
As couves ficaram por regar, as cabras por mugir
O vizinho ia partir!
Quantos invejavam esta hora, quantos!
As malas já estavam na porta
Malas novas e bem cheias.
Tudo novo!
Cuecas, camisas, peúgas,
Ceroulas para os dias de Inverno
E um pijama para alguma doença que houvesse.
Partir!
Ia partir para longe
Na boca um sabor a lágrimas e a fome também!
Nos olhos os campos verdes da sua terra
A fé de um dia voltar
De voltar com vida melhor!
Já pensara no lugar
Onde fazer a casa que sonhara
Com um quintal grande para ter animais!
Ia partir
Lá vinha a camioneta entre nuvens de pó
Os olhos de todos fixos nela
Angústias e emoções se chocam!
Era o adeus, Quem sabe se para sempre
Não, não seria para sempre
Não queria pensar nisso
Agora que chegara a hora
A vontade fugia-lhe,
Custava tanto partir!
Havia os filhos, a mulher os amigos
Custava tanto deixa-los, custava tanto!
A mulher não iria ao embarque na cidade
O dinheiro era pouco, o choque seria maior!
Queria seguir sozinho para não o verem chorar.
E o velho carro sujo do pó da estrada, arrancou.
O condutor tinha que cumprir o horário.
Lenços acenavam, olhos choravam
Lenços sujos de suor.
E aquele homem endurecido pelo trabalho
Mas de coração bom chorava também!
A mulher gritava que não lhe levassem o amparo
O companheiro.
As vizinhas confortavam-na
Os garotos
Limpavam o ranho e a baba ao avental da mãe,
Sentiam o desgosto também
Mas olhavam atónitos uns para os outros!
E ele o emigrante, olha para traz,
Deita o último olhar à sua aldeia
Ao sol, à família.
É o adeus, o partir.
As lágrimas não o deixam ver mais
Deita-se para a frente e chora.
Este será talvez o momento mais triste
Daqueles que emigraram.
Os elementos do Grupo Folclórico da Escola Transmontana,
liderados pela sua ensaiadora, Ana Costa, desfilaram com os trajes
regionais das diferentes Ilhas daquela Região Autónoma,
seguindo-se a actuação do artista comunitário
Miguel Cordeiro. Esta noite de cultura açoriana encerrou
com um Pico-de-Honra e convívio, onde a famosa gastronomia
dos Açores, onde um pouco de tudo esteve presente (favas,
massa sovada, morcelas, chouriço, feijoada, sopa do Espírito
Santo, etc.) deliciou o palato dos convidados presentes.
SEGUNDA-FEIRA, dia 3:
Palestra do Professor Dr. José Carlos Teixeira subordinada
ao tema - "Cinco décadas da presença Portuguesa
(
e/ou açoriana) no Canadá".
Foi também lembrado Fernando Feliciano
de Melo, um natural da Ilha de São Miguel e sócio
da Casa dos Açores de Toronto, bem conhecido e respeitado
no nosso seio comunitário pelos seus livros publicados
nestes últimos anos e que faleceu meses atrás, vítima
de doença súbita. Esta nota biográfica foi
lida pelo director da Juventude daquela Casa Cultural, Leo Machado
e enriquecida com uma declamação de Laudalina Rodrigues.
Na parte de entretenimento, actuou a jovem artista Tiffany Costa,
seguindo-se, de imediato, um convívio e amostra da culinária
açoriana.
TERÇA-FEIRA, dia 4:
Abertura com uma bem documentada e interessante palestra pelo
Professor Dr. Victor Pereira da Rosa sob a temática "Quo
Vadis? Dilemas da Sociedade Açoriana nos Açores
e na Diáspora".
Seguidamente, foi a vez da Professora Dra. Manuela
Marujo, do corpo docente da Universidade de Toronto, com outro
tema não menos interessante -"Mulheres Açorianas;
Ecos das suas vozes", tendo, a terminar esta sua palestra,
tido a intervenção de uma das suas alunas universitárias,
Daniela Pacheco, que contribuiu com a leitura de uma composição
de sua autoria sobre o papel desempenhado pela sua avó,
Maria Urânia, na sua formação durante a infância,
tanto na aprendizagem da língua mãe, como nos costumes
e hábitos do nosso povo. No fim da sua intervenção,
a professora Manuela Marujo presenteou a jovem e sua avó
com a antologia bilingue da Dra. Rosa Simas intitulada, "A
Mulher nos Açores e nas Comunidades", que tinha sido
lançado em Toronto por aquela docente da Universidade dos
Açores, semanas antes aquando do segundo encontro dos elementos
ligados aos Serviços Sociais na Diáspora, patrocinado
pela Direcção Regional dos Açores.
Por fim, interveio a promotora pública
da Coroa (Crown Attorney), Cidália Faria, com um trabalho
intitulado "Azorean women strong and proud". Seguiu-se
uma sessão de fados pela conhecida fadista açoriana
Luciana Machado que, cantou e encantou, com a sua bonita voz,
mesmo sem acompanhamento de guitarras e violas que, por razões
desconhecidas, não puderam comparecer. Não hajam
dúvidas que se trata de uma artista de grande nível,
esta nossa Luciana Machado. Finalmente, foi o momento de convívio
com aperitivos, doces e vinhos dos Açores.
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