Excerto da Intervenção do Prof. Onésimo Almeida

"Boa tarde.

Queria saudar Adiaspora.com. Parabéns ao José Ferreira a si e a toda a sua equipa. Sei que há pessoas que cá vieram única e exclusivamente para ouvir algumas anedotas novas, o que constitui para mim uma grande responsabilidade. Primeiro, porque não posso repetir anedotas e segundo, porque vim cá não para contar anedotas, mas para preencher a meia hora que me é destinada com a apresentação deste meu trabalho.

Vou proceder da seguinte maneira: Eliminarei duas páginas do meu trabalho, nomeadamente uma parte menos interessante e algo chata, iniciando como já fiz anteriormente ... certo dia um professor numa aula logo no início do ano lectivo, em Setembro, estava a contar umas tantas piadas aos seus alunos, que se riam à farta. Todavia, havia um rapaz lá nos fundos da sala que não se ria de forma alguma. Então o professor resolveu dirigir-se ao aluno e perguntou: ""Tu não gostas de humor?"Ao que respondeu este: - " Eu gosto, gosto sim." "Mas então não gostaste das piadas que vos contei? Então, tu não te riste" - voltou a indagar o professor. "Não senhor professor, é que sou repetente!"

De modo que antes de aqui chegar uma pessoa que está neste painel veio dizer-me que se lembrava de um "bad joke" (anedota com pouca piada) que eu tinha contado há muitos anos em Bóston. Ela lembrava-se dela de modo que tenho de ter o cuidado de não repetir. O Boston Herald fez uma série de entrevistas a vários professores americanos da área de Bóston. No final destas pedia a cada um dos professores que contasse uma história real das suas experiências nas aulas. Um deles disse que um dia estava numa aula e estava uma moça a dormir. O professor dirigiu-se ao aluno que estava ao lado desta. "Faça o favor de acordar a sua colega!" disse o professor. "Eu! Acorde-a o senhor que foi quem a pôs a dormir! - responde o aluno. De modo que se alguém adormecer enquanto eu estiver a falar, a responsabilidade é minha! No final do ano o professor percebeu que os dois eram namorados pois iam de braços dados. Ele diz que não se conteve e disse ao rapaz: - " Com que então a sua bela adormecida!"

Eu começaria por fazer um pouco o papel de professor. Houve quem me tivesse perguntado ali atrás o seguinte: " Eu já perguntei a várias pessoas e ninguém me soube dizer o que eram as palavras "Diáspora" e "Miscigenação". Como é possível que isto aconteça com algumas pessoas aí? Portanto, vou começar por dizer algumas palavras rápidas sobre estas visto estarem relacionadas com o que adiante eu tenho escrito.

A Diáspora é uma palavra que começou a ser utilizada no contexto das comunidades portuguesas há duas décadas e pouco mais. A palavra Diáspora referiu-se durante dois milénios exclusivamente aos judeus. Os judeus ficaram sem pátria, estando espalhados pelo mundo inteiro. Portanto, depois de terem perdido Jerusalém começou-se a utilizar a designação de Diáspora para descrever a dispersão dos judeus pelo mundo.


Há algumas décadas começou-se a utilizar este vocábulo, Diáspora. Recordo-me perfeitamente que o Professor Eduardo Lourenço - um das pessoas que mais respeito na cultura portuguesa - reagia - ainda hoje fica zangado - por verificar que ao referir-se à Diáspora as pessoas normalmente entendem por esta a Diáspora judaica. De modo será aconselhável utilizar-mos o termo a Diáspora Portuguesa ou ainda A Nossa Diáspora. De qualquer modo, esta significa as comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo à semelhança com o que acontecera com a Diáspora Judaica e que ainda acontece.

A palavra miscigenação - miscigenar é misturar, misturar genes. Nos 500 anos da cultura portuguesa, da história portuguesa, os portugueses misturam os seus genes na África, na América do Sul (no Brasil), e na Ásia. Miscigenaram-se, misturam-se e criaram os mulatos - os brasileiros dizem que os mulatos são uma criação portuguesa - por causa da miscigenação. Houve povos que não se miscigenaram muito. Os ingleses, por exemplo, foram para a África do Sul onde criaram o "apartheid", sobretudo os africânderes. As culturas nórdicas durante muito tempo evitaram miscigenar-se porque achavam que só os povos baixos, e quase negros, quase bárbaros é que se misturavam, miscigenavam. No século XIX os ingleses escreviam imenso contra os portugueses que era uma raça "baixa e porca" porque faziam amor com os negros. Hoje em dia a atitude deles é muito diferente em relação a isto e têm agora vergonha das coisas que então diziam. Mas nós não fomos melhores do que eles por termos dormido com as negras, as indígenas e as asiáticas.

Os portugueses miscigenaram-se porque não tinham em sua companhia as suas mulheres. Então viajavam só os homens. Quando os ingleses vieram para a América como para a Índia, vinham já casais por não querem estes se misturar, uma atitude diferente da dos portugueses. Falou-se aqui na nossa história que foi escondida pois durante muitos anos foi-nos dito que possuíamos uma história magnífica de miscigenação, que tínhamos sido os bons por que misturávamos com as outras culturas. Os povos não são melhores ou piores. Cada um resolve os seus problemas à sua maneira e porque nós, os portugueses, continuávamos a escravizar as negras com quem dormíamos. Não fomos melhores por isso.

Houve um sociólogo brasileiro que nos anos 20 e 30 escreveu imenso sobre a miscigenação portuguesa pela qual ficou fascinado, e com o que os portugueses fizeram, sobretudo no Brasil. A sociedade americana tem 10% de negros. É mais jovem do que a sociedade Portuguesa no Brasil ou mais ou menos da mesma idade. 10% da população da América é negra contudo há muitos mulatos. Por outro lado, no Brasil não se consegue criar as categorias de negro e branco. Existem 90 variações de mulato, uma gravação imensa, ou seja uma prova de que no Brasil houve maior mistura por parte dos portugueses do que com os outros povos do mundo. Voltando ao sociólogo brasileiro, Gilberto Freire, e ao seu fascínio pela miscigenação com essa marca portuguesa sobre a qual escreveu.

O português tinha criado o mulato e Salazar aproveitou-se disso para criar o famoso luso-tropicalismo onde nós éramos fomos os bons do mundo por nos termos misturado etc. etc. Criou a chamada ideologia do luso-tropicalismo da miscigenação das raças, onde nos ensinavam nas escolas que não éramos racistas, éramos óptimos e bonzinhos, que nós tivemos escravos mas tratávamo-los bem, melhor do que os outros. Esta ideologia, que fora uma adulteração da história, acabou por ser foi desmistificada após a revolução. Hoje há uma reabilitação do Gilberto Freire. A palavra miscigenação existe numa sociedade como a do Canadá onde há gente de todo o mundo e onde acontece uma maior miscigenação do que em Fall River. Aqui a comunidade portuguesa casa dentro da comunidade. Alguns casam fora, mas aqui é vulgaríssimos os filhos dos portugueses casarem por exemplo com uma italiana, com uma chinesa etc..."