DISCURSO PRESIDENTE DO GOVERNO REGIONAL DOS AÇORES,
CARLOS CÉSAR, NA CERIMÓNIA DE HOMENAGEM AOS PIONEIROS
DA EMIGRAÇÃO AÇORIANA PARA O CANADÁ
Palácio de Santana, 15 de Novembro de
2003
O Presidente Carlos César prestando homenagem
aos Pioneiros.
Assinalamos, nesta cerimónia, um momento da nossa História
particularmente simbólico, que se repetiu mil vezes, antes
e depois desta aventura açoriana para o Canadá,
num percurso de alvoroço e de confronto, entre o desejo
de partir e a ânsia de retornar.
A partir de hoje temos, entre nós, durante oito dias,
um pequeno grupo de pioneiros que há cinquenta anos rumaram
ao Canadá, deixando atrás pequenas ilhas de desesperanças
que agora revêem pejadas de novas gerações
com muita confiança num presente de progresso e num futuro
auspicioso.
A história da humanidade está norteada pelo signo
da descoberta: desde a revelação de que o mundo
é redondo, caminha-se para o esbatimento das distâncias
e reformulam-se, a cada instante, as visões da vida.
Essa descoberta, porém, andou sempre associada a um desejo
de aperfeiçoamento e de busca sem descanso de melhores
condições de vida.
Há cinquenta anos, vivia-se em Portugal sob um regime
ditatorial que, como qualquer modelo semelhante, postergava para
um plano de subalternidade o melhor da nação - as
suas gentes. Nos Açores, então, sentia-se com intensidade
o isolamento, a opressão e a inquietação
pelo futuro. A partida era, para muitos de nós, a solução.
Para o País era a exportação de um problema.
Mas os Açorianos, quando estes conterrâneos pioneiros
do Canadá superaram horizontes e foram dar ímpeto
a uma grande nação multicultural, já haviam
aprendido a seguir para o mundo, sulcando mares bravios, desbravando
áfricas, arroteando brasis, laborando Américas.
Com uma sabedoria experimentada em aventuras e ousadias, capacidades
de sofrimento e de inventiva, tenacidade e fé, argúcias
e desembaraços, desdém pelos imprevistos e deslumbramento
perante o nunca dantes visto, os açorianos foram aprendendo
o sentido da agora invocada globalização, integrando
a terra pouca das ilhas na relativa grandeza dos continentes distantes,
adquirindo a diversidade como bem, a dissemelhança como
riqueza, o distinto como tesouro, a língua como utilidade,
a cultura como honra, as origens como virtude. Estamos, neste
dia, muito orgulhosos destes nossos irmãos que nos visitam
e que trazem na sua bagagem decénios de histórias
de vida, que partilharão connosco como alimento de fraternidade.
Partiram como lavradores de sonhos e lá chegaram como
artífices e arquitectos de terras novas. Deles, ouvimos
os ecos, tanto das boas notícias como da pouca sorte.
Para os que triunfaram ou melhoraram na vida, valeu a pena partir
e chegar; valeu a pena a força que foi precisa para trabalhar
e criar raízes no novo mundo. Para eles, a ilha - mais
do que uma limitação natural - foi local de partida
para a liberdade. Deles estamos orgulhosos.
Mas os Açorianos estão também muito orgulhosos
daqueles seus irmãos que um dia partiram para vencer -
mas que... foram vencidos pela tristeza, pela doença, pela
fraqueza, pelo estranho, pelo inesperado ou pela má sorte.
Orgulhosos, porque eles também foram pioneiros, pois por
"pioneiro" não entendemos apenas aquele que sobreviveu
para contar a suas vitórias, ou para receber as homenagens
de uma vida de sucesso; "pioneiro" foi todo aquele que,
na medida da sua necessidade, da sua força da sua coragem,
do seu saber e da sua vontade, ousou dar um posso em frente, no
desconhecido, desse modo contribuindo para abrir para os outros
- os que optaram por ficar, os que não tiveram forças
para partir, e os que ainda não haviam nascido - uma porta
de esperança, acendendo para eles um farol no negrume das
noites das suas vidas.
Voltam agora estes pioneiros às nove ilhas, que são
agora os nove faróis da nossa vida. Encontram-nas iluminadas
por uma nova era, distante do sufoco de outrora, inculcada de
marcas de ambição e de desenvolvimento, de gente
que se vai auto-governando, conquistando passo a passo a sua maioridade
autonómica, consolidando a sua pertença a uma Região,
edificando com denodo o mais e o melhor, procurando transformar
injustiças e insucessos persistentes, e enovelando energias
e vontades para que os que partiram também se orgulhem
dos que ficaram.
Como Presidente do Governo dos Açores,
que mais lhes posso dizer, senão - obrigado, por terem
feito dos Acres um mundo. Obrigado por o recordarem, nesta cerimónia
simples, com a vossa inesquecível presença. Obrigado
pelo orgulho que sentimos - uns dos outros.
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