SENHOR DA PEDRA, UMA TRADIÇÃO SECULAR
Por Carlos Morgadinho - Adiaspora.com
A Igreja de Santa Inês desde 1972 que
vem realizando as festividades em honra do Senhor da Pedra, uma
tradição religiosa que os nossos primeiros imigrantes
oriundos dos Açores, e na sua maioria da Ilha de S. Miguel,
trouxeram consigo quando decidiram emigrar para outras terras
em busca de melhores meios de sobrevivência que, infelizmente,
a sua terra natal, naqueles tempos, não lhes podia proporcionar.
Consigo, não na bagagem, mas sim nos seus corações,
trouxeram a devoção e o fervor ao Senhor da Pedra
- uma tradição religiosa que remonta há cerca
de 500 anos e que enraizaram nesta nossa cidade de Toronto. No
presente, não é mais uma demonstração
religiosa restrita aquelas gentes açorianas, tendo-se alargado
aos portugueses de outras regiões, do Continente e da Madeira,
que também comungam neste culto.
A popularidade destas festividades tem incrementado de ano para
ano, atraindo milhares de nossos compatriotas de outras cidades
do Ontário, Província de Quebeque e dos Estados
Unidos da América do Norte, mais precisamente dos Estados
de Massachussets e Rhode Island.
As ruas circundantes da Igreja de Santa Inês,
por onde passa a procissão, encontravam-se engalanadas
com lindas colchas e muitas bandeiras do Canadá, Portugal
e Açores. O asfalto apresentava um trabalho decorativo
magnifico como se faz na Ilha de S. Miguel, só que aqui,
em Toronto, as flores foram substituídas por outros materiais,
não lhe tirando, no entanto, a sua beleza exótica
e deslumbrante, que foi bem apreciada por quantos ali compareceram.
A Igreja de Santa Inês comemora este ano
o seu centenário. As nossas gentes começaram a fixar-se
à volta desta Paróquia nos alvores da imigração
portuguesa para o Canadá, tendo para isso, já em
1968, sido estabelecida uma capela na cave da Igreja para poder
servir a nossa comunidade, que contava então com milhares
de pessoas de origem portuguesa, podendo prestar, desta maneira,
através do padre Alexandre Neves, serviços na língua
de Camões, com missas, casamentos, baptizados e funerais.
A 16 de Agosto de 1970, a Paróquia de Santa Inês
foi finalmente entregue à Comunidade Portuguesa pelo então
Bispo de Toronto, Philip Pocock, tendo sido nomeado seu pároco
o padre Antero de Melo. No ano de 1984, a Igreja de Santa Inês
é elevada a Paróquia Portuguesa e, com a saída
do padre Antero de Melo, esta Igreja é entregue aos missionários
do Espírito Santo, sendo então nomeado seu substituto
o padre Amadeu Pereira e mais tarde juntando-se-lhe outro sacerdote,
João Mónico, que ali ainda se mantém no momento
presente.
Este ano, as festas iniciaram-se no Sábado,
dia 3 de Agosto, pelas 17 horas, com um arraial na Trinity/Bellwoods
Park, que consistia de barracas de "comes-e-bebes" e
vendas de artesanato e outros artigos. Ali foi erecto um palco
onde se exibiram o Rancho Folclórico de Bailares e Cantares
de S. Miguel (da Igreja de Santa Inês), o duo brasileiro
Valber e Vanille e os artistas locais Michelle Madeira e Porfírio
Ribeiro, além das bandas filarmónicas da Igreja
de Santa Inês (Lira de Nossa Senhora de Fátima) e
da Comunidade portuguesa da cidade de Hamilton, cujas interpretações
ao desafio foram bem apreciadas por quantos ali presentes. Aquela
noite artística ao ar livre foi encerrada com a actuação
do artista luso-americano, Marc Dennis, vindo propositadamente
de Fall River (USA) onde reside.
Domingo, dia 4, pelas 10:30 da manhã,
deu-se início as cerimónias religiosas, com missa
solene e sermão na Igreja de Santa Inês. A procissão
vai para as ruas pelas 15 horas da tarde, percorrendo um itinerário
à volta da Igreja, cujas ruas estavam completamente cheias
com povo, apesar da chuva miúda e impertinente que até
ao meio da tarde caiu. A procissão fez-se acompanhar por
quatro bandas filarmónicas (Lira Nossa Senhora de Fátima
da Igreja de Santa Inês, Senhor Santo Cristo da Igreja de
St. Maria, Banda Portuguesa de Hamilton e Nossa Senhora de Fátima
de Hull/Quebeque), levando os andores com as imagens da padroeira
daquela Igreja, Santa Inês, São Vicente de Paulo,
S. José e, por último, a do Senhor da Pedra, após
que se juntou muito povo que fervorosamente acompanhava, quiças,
no cumprimento de promessas e Graças recebidas durante
o ano.
Naquela procissão viam-se crianças
e adultos com trajes de figuras bíblicas, santos e anjos
como, por exemplo, S. Vicente de Paulo, Menino Jesus de Praga,
Moisés, a Sagrada Família, Nossa Senhora de Fátima
e os três pastorinhos, S. João Baptista, e a Rainha
Santa Isabel que introduziu o Culto do Divino Espírito
Santo em Portugal, além de diversas associações
religiosas sedeadas naquela paróquia e elementos do Rancho
Folclórico de Bailares e Cantares de S. Miguel daquela
Igreja, trajados a rigor.
Os políticos não faltaram, como
é da praxe, e juntaram-se à nossa gente na procissão,
entre os quais o deputado federal, Art Eggleton, os vereadores
de Toronto, Joe Pantalone e Mário Silva, o deputado federal
daquele circulo eleitoral, Tony Ianno, as luso-canadianas Ana
Bailão e Nellie Pedro, candidatas às próximas
eleições autárquicas e provinciais, respectivamente.
Presentes também a Presidente do Município de Ponta
Delgada, Dra. Berta Cabral, de visita a Toronto a convite do Centro
de Divulgação da Cultura Açoriana no Canadá
e da Casa dos Açores de Toronto e o Comendador e dirigente
do Sindicato Local 183, Tony Dionísio.
Após a procissão, muitos dos presentes,
como é habitual, dirigiram-se para o Trinity/Bellwoods
Park onde, pelas 17:30 horas, se deu continuidade ao programa
festivo com os artistas Valber e Vanille, um duo brasileiro já
popular na nossa Comunidade e o Marc Dennis, além de dois
jovens de 13 anos de idade, o Chris Costa e Shawn Oliveira, cuja
actuação nos agradou sinceramente, não só
pela qualidade do reportório apresentado, mas também
pelo "ar profissional" que muitos dos chamados profissionais,
por vezes, não têm. Estes dois artistas de "palmo-e-meio",
naturais de New Bedford (Massachussets), vêm actuando juntos
há já cerca de quatro anos, tendo ganho dois festivais
da canção - o de Novos Talentos 2001 e Rádio
Globo Festival.
Actuaram, naquela tarde, mais uma vez, as bandas ao desafio
que, em dois coretos, fizeram a alegria das gentes oriundas das
Ilhas de Bruma e que é uma tradição secular
naquela região de Portugal. O concerto das duas bandas,
a Lira Nossa Senhora de Fátima e do Senhor Santo Cristo
das Igrejas de Santa Inês e de Santa Maria, respectivamente,
foi o delírio do muito povo que enchia aquele lugar pela
soberba actuação dos números executados.
É de se notar que grande parte dos membros (músicos)
daquelas duas bandas ser composta por jovens menores de 25 anos.
Impressionante também, naquele Domingo, o cenário
majestoso daquele recinto cuja multidão se contava aos
milhares, não escapando a colina e sua vertente, coisa
que francamente nãos víamos há muito.
Na Segunda-feira, último dia das festividades daquela
paróquia, encerrou com mais um excelente espectáculo
destes três dias de fé e confraternização
e alegria, desta no adro da Igreja, onde, pelas 18 horas, se iniciou
o último segmento do programa de variedades com as actuações
dos artistas Michelle Madeira, Steve Medeiros, Porfírio
Ribeiro e Marc Dennis, sendo estas encerradas com o bem conhecido
artista, Décio Gonçalves, com as suas interpretações
de trechos bem populares e do agrado das nossas gentes.
Pelas 22 horas, foi encerrada as festividades
e dado início ao tão ansiado sorteio de diversos
prémios dos quais se contava duas viagens, uma a Portugal
e outra à Flórida (EUA), tendo para isso comparecido
no palco os elementos da Comissão de Festas da Igreja de
Santa Inês, seus párocos, João Mónico
e Amadeu Pereira, além de um agente fardado da Policia
de Toronto. O prémio mais cobiçado, o automóvel
Chevrolet Cavalier coube a Zulmira Cabral. Ainda não foi
desta que a sorte nos sorriu. Talvez para o ano, se Deus nos ajudar.
Queremos congratular a Comissão de Festas da Igreja de
Santa Inês pelo excelente trabalho na organização
destes três dias de festas tradicionais em honra do Senhor
da Pedra, evento que, não só pelo cariz religioso,
mas também pelo civismo demonstrado pelas nossa gentes
no seu decurso que bem honrou a nossa Comunidade na sociedade
multi-étnica canadiana em que integramos. São festas
que enchem os corações, não só de
encanto religioso, mas também de alegria no reencontro
de muitos familiares e amigos espalhados por este continente da
América do Norte.
Nota:
Esta devoção à Santa Face de Cristo no pretório
de Pôncio Pilatos vem já desde o século XIII,
tendo-se espalhado rapidamente por toda a Europa na qual Portugal
está inserido e, mais tarde, passando aos Açores
após a sua descoberta. Aqui, o seu culto foi perseverado
pelas suas gentes ao longo dos séculos até aos nossos
dias. Esta devoção espalhou-se mais tarde pelos
quatro cantos do Mundo quando o povo açoriano começou
a emigrar à procura de melhores horizontes.
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