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A Festa da Piedade e o Pe. Francisco Vieira Soares

 

Quando rabisco nestas notas decorre na freguesia da Piedade, da Ponta, a festa da Padroeira. Uma festa que trás à lembrança bons momentos vividos, em tempos passados, naquele extremo da Ilha, celeiro abundante e, outrora, fértil em vinhos de casta nobre, como hoje lhe chamam.

A primeira vez que fui à Piedade, na companhia de meu saudoso Pai, foi em Julho de 1927, para assistir, a seu convite, à Missa Nova do Padre Francisco Vieira Soares. Voltei, alguns anos depois, para colaborar na capela local, nas festas de Nossa Senhora da Piedade. E não era fácil lá chegar, pois a estrada ainda não havia sido construída. Do porto das Lajes íamos até ao da Calheta, numa das lanchas locais – Lourdes ou Hermínia - e seguíamos a pé, normalmente o Sr. Chico Castro, organista e eu próprio, pelos velhos caminhos, até à Piedade. Recebia-nos o velho e simpático Pároco, Pe. Francisco Soares. Da capela faziam parte entre outros, o José Laranjeira e o Tomé Freitas, que possuíam boas vozes de tenor. E só destes me lembro.

Mais tarde passei a ir anualmente na camioneta da carreira, até à Ponta da Ilha, já então a estrada estava concluída.  E que bons e saudosos momentos ali passei, na companhia da Olga, saudosa  e querida esposa e dos nossos filhos, que, felizmente, não mais esqueceram o lugar da Engrade onde ainda existe a nossa secular adega ou casa de verão.

Não faltávamos à Festa de Nossa Senhora da Piedade!

Mas, voltando ao Padre Soares (o Novo como era conhecido), importa mais dizer.

Como já referi em anterior escrito (1), o Padre Francisco Vieira Soares nasceu nas Lajes do Pico em 26 de Julho de 1902.

Com o falecimento da Mãe, era ele criança ainda, foi para a Piedade aos cuidados da avó e do tio Pe. Francisco Soares, também natural desta Vila, pároco daquela freguesia. Ali cresceu e dali foi para o Seminário de Angra, onde se ordenou em 1927. Como primeira colocação teve a Redacção da “Democracia”, na Horta, jornal que havia sido comprado pela Diocese. Com a chegada do novo Prelado, o jornal é vendido e o Pe. Soares é nomeado Cura dos Cedros, do Faial. Ali chegado, funda, com um grupo de professores da freguesia, entre os quais Manuel de Ávila Coelho, natural da Piedade, a revista  “O Eco Cedrense”. O Bispo Diocesano, inesperadamente retira o Pe. Soares dos Cedros e coloca-o na Prainha do Norte, Pico, apenas por alguns meses, pois, logo a seguir, transfere-o para a paróquia da Lomba, na Ilha das Flores.

O Pe. Soares não era pessoa para cruzar os braços. Logo que chegou à nova paróquia e verificando a carência de uma moradia para o Pároco, tomou a  arrojada iniciativa de construir uma casa para passal. E ela lá ficou.

A ele se ficou a dever também  a fundação da Filarmónica local. E quando outros projectos tinha em mente, para não falar na cooperativa de lacticínios é transferido para a freguesia de Ponta Delgada da mesma ilha.

Naquela importante freguesia florentina funda a Filarmónica local. Mas isso implicava a preparação dos tocadores, os ensaios, a escolha dos reportórios adequados, etc., tal como já acontecera na Lomba. (E aqui um pequeno reparo: é estranho que os historiadores florentinos – aqueles que me é dado conhecer – ignorem a actividade do Pe. Francisco Soares naquela ilha).

Não muito tempo decorrido, o Padre Francisco Vieira Soares é transferido para S. Caetano do Pico, onde organizou uma sociedade para a pesca da albacora, então em franco desenvolvimento.

Quando o trabalho estava a frutificar, é convidado a voltar às Flores. Não aceita. O tio, Pe. Francisco Soares, há longos anos vigário da Piedade, ia naturalmente envelhecendo. O Pe. Francisco era o único parente válido. Tornava-se imperioso regressar para junto daquele que o amparara na juventude. E fica na Piedade de coadjutor do tio Padre. Depois, este pede a manência e o Pe. Soares é nomeado vigário.”(2)

A actividade desenvolvida pelo Pe. Francisco Vieira Soares, na Paróquia da Piedade, está ainda bem presente. O Salão Paroquial ostenta o seu nome pois foi ele quem adquiriu um antigo edifício e o transformou no actual salão.

Substituiu o tecto da ampla igreja e nela fez outras importantes reparações.

Em 1944 compra, em S. Mateus, com o auxilio do Dr. Eduardo Machado Soares, o instrumental da antiga “Lira Picoense” que ali existira e havia sido fundada pelo Pe. Manuel José Lopes e funda, na Piedade, a “União Musical da Piedade”. Ensinou música aos futuros tocadores e entregou a regência a Manuel José (Racha). Com a saída do Manuela Racha para a Praia da Vitória, onde chegou a reger a Filarmónica daquela então vila e hoje cidade, passou a reger a “União Musical” Manuel Francisco Soares. E outros foram sucedendo.

O Pe. Francisco, que era um excelente músico e Regente de capela, ( não tivesse sido aluno do Pe. José d´Ávila), por onde passava, organizava as respectivas capelas paroquiais e ele próprio as regia enquanto não preparava outro para as reger.

Poeta de grande sensibilidade  e jornalista combativo, era ainda “apreciado orador sacro, possuía um estilo tão acessível aos auditórios populares que o escutavam com prazer”.(3)

Sacerdote de uma notável acção pastoral  e responsável inteligente e culto, modesto e dedicado, era uma “personalidade de nítida vocação literária que viveu numa contínua contradição imposta por quem foi incapaz de o compreender e de aceitar os rasgos intelectuais e mortais de tão brilhante espírito”.- (4).

A Piedade comemorou a sua semana de festa. Aqueles dias deveriam servir para se recordarem os seus maiores filhos e eles foram tantos...

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