Na velha tradição popular, o ano era dividido, para alem dos tempos litúrgicos, em épocas de festejos populares. Uma maneira simples de fazerem as suas comemorações anuais, consoante os tempos que decorriam.
Terminada a época do Natal, com a celebração dos Reis Magos, vem um pouco a seguir, o Carnaval, festejado até à quarta-feira de Cinzas, que marca o início da Quaresma. Depois vem a Páscoa e em seu seguimento, as Folias, ou Festas do Espírito Santo.
As festas de verão, espalhavam-se pelas paróquias onde, normalmente, eram celebrados os Santos Padroeiros.
Entrava-se depois no Advento, um tempo de pausa, dedicado ``as festas familiares das “matanças do porco”, para se entrar a seguir no mês de Dezembro, o mês do Natal por excelência.
Por esta Ilha o povo tinha o seu modo de celebrar cada tempo.
Estamos no Carnaval. Tempo de folganças e de convívios. Antes do Carnaval ou Entrudo, existem as chamadas quintas-feiras de Amigos e Amigas, Compadres e Comadres, que servem para reuniões de confraternização amiga e folgazã.
Presentemente esses dias são assinalados com almoços ou jantares em que não há mistura de sexos. No dia de amigos não entram as mulheres. Na quinta-feira de amigas não entram os homens… E assim nas restantes quintas-feiras.
Até meados do século XX era diferente. Tais dias, bem como os sábados e domingos intercalares, serviam para os mais afoitos, darem largas aos seus espíritos criativos e burlescos, visitando, ao serão, as casas amigas ou que as portas lhes abriam, e onde se reuniam amigos e vizinhos, para receber os “mascarados”. E alguns deles tinham sua graça. Por vezes serviam para recordar, com um pouco de hilariedade, acontecimentos ocorridos durante o ano; outras vezes para imitarem pessoas nos seus “pontos fracos”.
Os “mascarados” eram o delírio de velhos e novos. Mas as crianças é quem mais gozavam com esses que, não tendo a coragem de se exporem, refugiavam-se nas máscaras as mais bizarras e nas vestes, por vezes de sexo diferente … utilizando vozes disfarçadas para não serem reconhecidos.
Muitos jovens preferiam organizar pequenos ranchos de dança e cantares, que tudo servia para se divertirem e àqueles a quem visitavam. Havia mesmo famílias que, possuindo salas mais espaçosas, anualmente abriam suas portas e “recebiam mascarados”, Igualmente havia aqueles que, em chegando à época de Carnaval, tinham o “vício” de se mascararem para darem largas ao seu espírito crítico.
Em muitas dessas salas organizavam-se as tradicionais folgas, onde se bailavam chamarritas, enquanto os mascarados não apareciam.
Tudo, porém, terminava à meia noite da terça-feira de Carnaval. Na quarta-feira de Cinzas principiava a Quaresma e o povo vivia este tempo com o maior respeito e seriedade.
Não deixa de ser interessante o significado que, do termo Carnaval, nos dá o Dr. José Pedro Machado (Dicionário da Língua Portuguesa) . Primeiro diz que o vocábulo vem do termo italiano carnevale para, a seguir, nos oferecer o significado: “Os dias, semanas ou meses, conforme os usos dos países, que precedem a Quaresma. // Bailes, danças, festas, regozijos, mascaradas, orgias, que precedem a quarta-feira de cinzas; Entrudo”, etc.
A partir de meados do século passado desapareceram os mascarados e as danças de rua. Com o aparecimento dos salões sociais, o Carnaval ficou reduzido aos assaltos e aos bailes dos últimos dias, sem se atender, contudo, à praxe de terminarem na terça-feira mas prolongando-se pela noite dentro até â quarta-feira de cinzas.
Uma outra maneira de festejar o Carnaval…
Será que o velho ditado tem aqui sua aplicação?
“Mudam-se os tempos, mudam-se os pensamentos”
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