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As Festas do Divino Espírito Santo


Estão a terminar no lugar das Terras, desta Vila, as festas em louvor do Divino Espírito Santo, que ali têm decorrido, nas últimas Domingas, depois da Páscoa, com grande luzimento. Registam-se aqui os nomes dos Mordomos do corrente ano, que honrosamente continuam uma secular tradição familiar: lº. Domingo, Alberto Soares Pimentel; 2º. Manuel da Rosa da Silva; 3º. Manuel Fagundes da Rosa Soares; 4º. Maria Fernanda (Soares) Simões; 5º.Manurel Pereira Madruga; 6º. José Adelino Fagundes. Em breves dias chegaremos às Festas propriamente ditas. Elas decorrem por todas as ilhas dos Açores mas têm um cunho muito especial nesta ilha do Pico onde ainda se cumprem escrupulosamente os votos dos antepassados.

Sabido que as festas vieram até estas ilhas, trazidas pelos primeiros povoadores e seguindo a tradição das festas de Alenquer, onde tiveram inicio por mercê da Rainha Santa Isabel. E lá se conservam, segundo rezam os Anais daquele concelho.

Nos Açores intensificou –se a devoção ao Divino Espírito Santo na Ilha de São Miguel quando, naquela ilha, apareceu um surto de peste, no ano de 1523, que fez 2000 vítimas e se comunicou ao Faial. E, sobre essa mortífera epidemia, escreve Lacerda Machado na “História do Concelho das Lajes”: “O pânico foi geral em todas as ilhas e os povos aterrados recorreram a preces públicas, procissões e invocaram em especial o Espírito Santo, prometendo distribuir pelos pobres anualmente, pela festa do Pentecostes, as primícias de seus frutos, se escapassem do terrível flagelo, que se não comunicou ao Pico.

“Instituíram-se irmandades em honra do Espírito Santo, celebrando em seu louvor bodos solenes, com folias e bailes, ao uso do tempo.”

Festa do Espírito Santo no Lugar das Terras

Como sempre acontece, as festas afrouxaram, naturalmente por carência de meios, dada a crise que as populações suportaram nos primeiros séculos do povoamento destas ilhas, onde se registaram anos de fome, quando os temporais destruíram as culturas.

De fome foram os anos de 1588, 1596, 1599, 1647, 1709, 1776, 1785.

Lacerda Machado, autor citado, referindo-se ao ano da fome de 1858, (1) diz que o Capitão Manuel Machado Soares minorou a penúria e a miséria de grande número de famílias, dispondo nobre e generosamente de seus teres.

Segundo a tradição e a própria história, os impérios do Espírito Santo foram “restaurados” por ocasião das crises sísmicas de 1718 e 1720.

Na “História do Concelho das Lages- 1915”, (2), o seu erudito Autor regista-se os seguintes: Na Piedade, no domingo do Espírito Santo, segunda-feira e Domingo da Trindade, que ainda se mantêm; na Calheta, no Domingo do Espírito Santo, segunda-feira e Domingo da Trindade; nas Ribeiras, domingo do Espírito Santo e domingo da Trindade, em Santa Bárbara e na segunda-feira e terça-feira em Santa Cruz; e domingo e terça-feira em São João. Nas Lajes realiza-se o império do sábado do Espírito Santo na Silveira que, segundo a tradição, é o cumprimento de um voto feito em 1720 quando a lava do vulcão atingiu o Soldão e o Domingo do Espírito Santo na Ribeira do Meio. Na Silveira realiza-se actualmente o império do Domingo da Trindade. Na Vila das Lajes realiza-se, desde 1940, o império de São Pedro, no dia 20 de Junho.
Diz ainda a “História do Concelho das Lajes” (pág.138): “Anteriormente á crise mundial, provocada pela guerra, efectuavam-se na vila mais os seguintes impérios, hoje desaparecidos: Domingo do Espírito Santo, segunda-feira do Espírito Santo (dos marítimos) e terça-feira do Espírito Santo (dos nobres).

Abrilhantavam os cortejos e a própria solenidade os Foliões, com tambor, pandeiro e ferrinhos. Tal como hoje, tinham bandeira própria, e usavam na cabeça, atados à nuca, lenços de mulher, vermelhos. Hoje isso desapareceu. Na freguesia das Lajes, em São João na Piedade e na Calheta ainda existem grupos de foliões que, durante o cortejo e à porta da igreja, costumam cantar umas loas dedicadas ao Divino Espírito Santo.

Nos primeiros tempos os foliões tinham por hábito acompanhar as coroas na igreja e aí cantavam e dançavam durante as cerimónias litúrgicas.

“O primeiro bispo açoriano que consta ter proibido tais divertimentos foi D. frei Jorge, nas suas constituições de 1558, não consentindo nas igrejas jogos, toques de viola, guitarra ou flauta, bem como bailes e cânticos profanos.

“As providências do virtuoso prelado foram, porém, iludidas e os abusos continuaram.

“Em 1597, D. Filipe I proibiu as folias e bailes nos festejos dom Espírito Santo, mas parece que nem por partir de alto a proibição teve melhor acatamento, porque em 1600, o Bispo D. Frei Jerónimo Teixeira, novamente proibiu aos foliões o bailarem na capela - mor no acto da coroação.” (3).

O mesmo diz o Cónego Pereira quando, referindo o 69º Bispo, D. Jerónimo Teixeira Cabral, que governou a Diocese de Angra entre 1600 e 1612, informa que esse Prelado, “Não foi menos rigoroso na correcção dos abusos da disciplina eclesiástica: - “Proibiu que os foliões das festas do Espírito Santo bailassem mais na capela-mór das igrejas, na ocasião de serem coroados os” imperadores.” (4)

Hoje continuam os “Impérios” na Ilha do Pico, em todas as freguesias, com a distribuição de milhares de rosquilhas, vésperas ou pão, consoante os lugares e a tradição, por todos os presentes, sem distinção de condições sociais.

E acessoriamente se regista que em todos as freguesias e lugares da Ilha, onde se realizam os “Impérios”, existem capelas, ou copeiras onde são conservadas as Coroas do Divino Espírito Santo, tal como em diversas ilhas do Arquipélago.

Mesmo assim, os açorianos, em geral, mantêm uma tradição religiosa de mais de cinco séculos, que os honra e enche de orgulho, digamos um santo orgulho, porque nunca é demasiado o culto que se possa prestar à Terceira Pessoa da Santíssima Trindade.
__________
l) Lacerda Machado, “Os Morgados das Lages, Ilha do Pico” –l9l5, pág.16-
2) Idem, “História do Concelho das Lages” – 1936,pág. 136.
3) Idem, idem, pág.136
4) Cónego Pereira, “A Diocese de Angra na História dos seus Prelados”, 1950, pág.63.

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