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Trigo e Milho

 

“O Pico, dada a natureza dos terrenos, produzia pouco trigo, se bem que, em anos normais, ‘fosse de sobejo para a ilha’.

“A produção mais expressiva da ilha deu-se no ano de 1702: 1 OOO moios de trigo e 20 mil pipas de vinho. Nesse ano a população não devia ir além de dez mil habitantes.

“Quando escasseava o trigo este cereal era importado das ilhas Terceira e de S. Miguel. Pouco vinha do Faial.

“A cultura do milho  foi introduzida na ilha em 1670 por Denis Gregório de Melo, capitão-general dos Açores e a batata branca ou batata comum chegou aos Açores e distribuiu-se pelas ilhas em 1775.

“A batata-doce veio de S. Miguel para a ilha do Pico em 1860 e rapidamente se generalizou a sua cultura por toda a ilha. Só mais tarde apareceu no Faial.

“O inhame foi introduzido nos Açores no século XVI. Numa escritura de data de 13 de Fevereiro de 1752 eram doados na freguesia da Candelária dois pedaços de terra de inhames e pastos.”(1)

Carro de bois que servia para transportar milho e demais cereais

Em tempos recuados, era agradável passar pelas terras da Vila nos meses de Julho e Agosto e presenciar a azáfama que ia na apanha dos trigos e a debulha nas eiras que  existiam. Lembro-me de  uma construída no lugar das Terras, aí pela década de vinte onde era debulhado o trigo das redondezas. E principalmente nos anos em que as “Domingas do Espírito Santo”  pertenciam àquele lugar, a sementeira do trigo duplicava, permitindo que, principalmente na zona da Queimada, grandes extensões de searas pudessem ser vistas e admiradas cá do alto. Um verdadeiro encanto, redobrado pelas vozes e cantares das moças que vigiavam a praga.

No Outono não menos  agradável era passar pelas bandas do Sul do Pico e vêr nas encostas, ou ladeiras ,  grandes serrados, chãs e pequenas velgas com milho a secar para ser colhido antes que as chuvas chegassem . Hoje, aquele que se semeia é apenas para silagens...

Era um dia de festa o da debulha nas eiras. Aqui nas Lajes  havia duas e ambas elas no “Juncal” uma ali construída e a outra natural – uma grande laje onde era colocado, no centro, o “moirão” no qual era enfiada a arça da cobra .A esta  eram presos os bois e vacas que, durante horas e horas, andavam  sobre o trigo até que este estivesse completamente debulhado ou separado da palha.

O gado era trazido do mato somente para aquele trabalho e, terminado ele, voltava às pastagens ou ao baldio.

“Aventajado”, o trigo era recolhido em sacos e a palha, em grandes fardos, para  ser utilizada normalmente em colchões. (Ainda não existiam os modernos colchões de espuma ou de outros materiais sintéticos.)     

Um grande dia o da debulha. Hoje, por estas bandas, deixou-se praticamente de cultivar o trigo. As moagens fornecem as farinhas e as padarias encarregam-se de cozer diariamente o pão...

Forno que servia para secar o milho cozer o pão e aquecer a casa

Mas, não menos desejada era a “desfolhada”. O milho, recolhido, depois de bem maduro, era descascado e seco no forno. Debulhado à mão, ou em máquinas americanas trazidas pelos emigrantes retornados, era cuidadosamente guardado em recipientes próprios (barricas, arquibancos e, recentemente, depósitos de zinco) para ser utilizado durante o ano. O milho era a fartura e a garantia da subsistência das famílias.

A desfolhada realizava-se ao serão. Novos e velhos, familiares e vizinhos, todos se juntavam na loja ou na “atafona” para tirar a capa à maçaroca de milho. E enquanto se procedia a essa animosa tarefa, os “casos”, os ditos, as críticas aos acontecimentos passados, eram alegremente desbobinados até que, no meio daquela alegria, aparecia uma maçaroca com milho vermelho. Era o delírio com os abraços e ditos xistosos...

A meio do descascar do milho, aparecia a dona da casa com o prato de figos passados e a garrafa de aguardente, para brindar os circunstantes. Uma praxe rigorosamente cumprida.

Mas tudo isso passou. Os idosos vivem das recordações e os novos nem sabem dessas velhas tradições...

1) E.Ávila- “Ilha do Pico – suas origens e suas gentes (Notas Históricas) “-1988 –pág..51.

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