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Crónica Natalícia


Escrever uma crónica nesta época do Natal nem sempre é tarefa fácil. Por vezes vêm-nos à memória acontecimentos de outras eras que, traze-los aqui, a este espaço que gentilmente me é oferecido, se torna doloroso recorda-los.
A vida actual é tão diferente em todos os seus matizes que recordar coisas ingenuamente vividas nem sempre são bem compreendidas pelos leitores, sobretudo os mais jovens. E, afinal, quanto não teria a massa jovem de aprender com esse passado que não vai muito distante!

Que me lembre, na antevéspera do Natal havia a “Noite da Calhandra” onde grupos de amigos se juntavam para uma ceia de  carne de carneiro, algumas vezes subtraído dos pastos dos vizinhos. E isso porque a noite da Véspera do Natal era considerada de abstinência, e, como tal, era proibido aos cristãos comer carne. Valia o queijo curado, muitas vezes oferecido como prenda de Natal, por lavradores amigos.

Afora esses singelos manjares, não há muitos anos o NATAL era recordado somente nos templos com cerimónias litúrgicas adequadas à solenidade.

Depois foram-se introduzindo os bailes com merendas, no próprio dia da Festa.

Não se conhecia o bacalhau e se por cá aparecia, o seu preço tornava-o privado das bolsas da generalidade das pessoas. A partir do segundo quartel do século XX, já depois da segunda Grande Guerra haver terminado, uma evolução  assombrosa se deu dos hábitos e costumes das pessoas, principalmente com a vinda de alguns continentais a ocupar diversas funções administrativas que se foram criando e para as quais os nativos não tinham  habilitações próprias, nem o curso liceal, vedado à juventude que vivia fora das ilhas capitais e só permitido aos jovens que viviam nas três cidades açorianas. Com excepções, naturalmente.

Aqui e ali foram aparecendo as sociedades recreativas e, nos pequenos salões, promovidas reuniões dançantes, utilizando-se instrumentos de cordas, pois os pianos eram privativos de duas ou três famílias, últimas dos antigos morgadios.

E, do Natal à Quaresma, não deixava de haver, em quase todos os domingos ou vésperas, bailes e reuniões tipicamente familiares. 

Mal se conheciam as árvores do natal, que a pouco e pouco começaram a aparecer nas casas particulares “trazidas” por alguns emigrantes regressados dos Estados Unidos.

Presépios, só os altarinhos onde era colocada, entre pratinhos de trigo e pequenos vasos de flores com dois ou quatro castiçais com velas, a imagem do Menino Jesus, quase sempre uma relíquia familiar. Na igreja, porém, e em uma ou duas casas particulares, “armavam-se” grandes Presépios, com pequenas estatuetas  e as imagens da Sagrada Família, esta recolhida em pequena gruta.

Tudo tão diferente, como era diferente a mesa do Natal onde só aparecia a carne de “caçoilha” e pão de trigo. Nem se falava em “bolo do Natal”, pois os primeiros que aqui foram conhecidos vieram pelo Correio, enviados por amigos e parentes residentes na América do Norte.

O Dia de Natal, à tarde, era destinado à visita das famílias – filhos e netos, em conjunto aos pais e avós – ou de pessoas mais amigas. E era tudo.

Apesar disso, com bom tempo, que permitia as ditas visitas, vivia-se com alegria esse dia maravilhoso. Um dia que se não esquecia mais, principalmente as crianças por alguma prenda que recebessem ou por alguns figos passados ao Sol no final do Verão que, os vindos do Algarve em seiras, apareceram mais tarde…

E estamos novamente no Natal. Que seja vivido com alegria, paz, harmonia, saúde. Que para todos haja muitas felicidades!

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