São vários os conceitos e variados os valores assumidos. Os ateus tem o direito de o serem, mas devem respeitar os que não o são, da mesma forma que os católicos, evangélicos, luteranos, calvinistas, islamitas, judeus, budistas ou hindus, enfim os que professam uma crença religiosa, também têm o direito de respeitar os que não pensam como eles e até também os ateus. Então porquê a agressão desnecessária, mesmo que sendo a livre expressão de alguém que se julgue com esse direito, ao catalogar a Bíblia (toda?) como “um manual de maus costumes, um catálogo de crueldade”? Não irá essa afirmação muito para além da estrita liberdade de expressão e de pensamento que se reconhece a qualquer cidadão, mas que também não deveria entrar no campo da afronta aos seguidores desse, para nós, Livro Sagrado? Há necessidade de agredir intelectualmente milhões de cidadãos portugueses que tanto se hão rejubilado com a atribuição de um Prémio Nobel da Literatura a um seu tão ilustre concidadão? Há necessidade de os afrontar quase, direi eu, inadvertidamente? Julgo que não e aqui deixo algumas reflexões, serenas e prudentes, como não poderiam deixar de ser, por parte de alguns estudiosos da Igreja Católica:
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- O P.e Fernando Ventura afirmou que José Saramago teria a exigência intelectual de se informar antes de escrever. “A Bíblia pode ser lida por alguém que não tem fé, mas supõe alguma honestidade intelectual de quem a lê”, afirmou, acusando-o de “uma falta gigantesca” dessa honestidade. Mais grave, acrescentou o capuchinho, é o desconhecimento “do que são géneros literários” ou do lugar do “mito” na literatura, o que considera especialmente negativo num escritor que se debruçou “sobre um âmbito que não domina, (e conclui) “Não saber situar o texto no contexto é imperdoável para um escritor”.
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- D. Manuel Clemente, Bispo do Porto, que já veio presidir à Festa do Bom Jesus, responsável pela área da cultura na Conferência Episcopal Portuguesa, disse que "uma personalidade como José Saramago, que tem mérito literário inegável, deveria ser mais rigoroso quando fala da Bíblia”. Segundo o bispo, “bastaria ler a introdução a qualquer livro da Bíblia, nomeadamente o Génesis, para saber que são leituras religiosas acerca da história de Israel”, depois recolhidas como “história bíblica para todos os cristãos e todos os crentes” e também conclui que Saramago utilizou um discurso de “tipo ideológico, não histórico nem científico” e revela uma “ingenuidade confrangedora” quando faz incursões bíblicas.
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- Já o P.e Manuel Morujão, secretário da CEP, lamentou a “superficialidade” com que Saramago se debruçou sobre a Bíblia, considerando que “entrar num género de ofensa não fica bem a ninguém”, sobretudo a quem tem um estatuto de prémio Nobel da Literatura, e disse que esperava “mais” do prémio Nobel, “independentemente da sua ideologia” e recomendou “humildade” nas opiniões, para que estas não se apresentem como “pseudodogmas”. O sacerdote desejou ainda que se promova “muito mais a cultura bíblica”. ( www.zenit.pt - com Agência Ecclesia)
Mas também registamos a opinião de Vasco Pulido Valente, com a qual não me identifico, por ser demasiado violenta para a minha sensibilidade cristã, e da qual vos deixo uma pequena nota: “Claro que Saramago ganhou o Prémio Nobel, como vários "camaradas" que não valiam nada, e vendeu milhões de livros, como muita gente acéfala e feliz que não sabia, ou sabe, distinguir a mão esquerda da mão direita. E claro que o saloiice portuguesa delirou com a façanha. Só que daí não se segue que seja obrigatório levar a criatura a sério. Não assiste a Saramago a mais remota autoridade para dar a sua opinião sobre a Bíblia ou sobre qualquer outro assunto, excepto sobre os produtos que ele fabrica, à maneira latino-americana, de acordo com a tradição epigonal indígena. Depois do que fez no PREC, Saramago está mesmo entre as pessoas que nenhum indivíduo inteligente em princípio ouve.” ?!?!
Enfim, bastaria seguir a máxima: a maior liberdade deve corresponder maior responsabilidade, ou ainda: a minha liberdade acaba quando colide com a do meu semelhante.
Qualquer uma delas tem plena aplicação no caso vertente.
Com tudo isto convenhamos caros leitores, que as seguintes mensagens bíblicas: “Glória a Deus no Céu e Paz na Terra aos Homens de boa-vontade” ou ainda aquela proferida, no Calvário, por Jesus Cristo já crucificado, referindo-se aos seus algozes: “Pai perdoai-lhes porque não sabem o que fazem”, nada tem de manual de maus costumes, e muito menos poderão fazer parte de um qualquer catálogo de crueldade…
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