Pelo Natal tive o grato prazer de receber um telefonema do meu primeiro professor primário, o Sr. Professor Ruben Rodrigues, o mesmo que, durante anos, calcorreou a nossa ilha, na Biblioteca Calouste Gulbenkian, aconselhando e incentivando o gosto pela leitura, numa iniciativa sem paralelo até hoje. Depois da conversa circunstancial, pediu-me a minha morada. Recebi na volta do correio, a preciosa oferta do seu livro: NASCIDO DO MAGMA. Mas que livro… Mas que história… E que dizer das vivências… das tristezas, das esperanças, dos sonhos, das virtudes e dos valores sociais ali plasmados?
A luta insana pela sobrevivência, que, no dizer do escritor “não permitia mais devaneios do que aqueles que aconteciam por altura das vindimas, da matança do porco, da festa da padroeira ou do Espírito Santo”, e o ganha-pão complementar, o corte de lenha aproveitada em achas e cacetes, a enviar nos barcos do pico até
à Central Eléctrica da Horta, no Faial. Toda esta epopeia de vida, perpassando por uma cidade, a Horta cosmopolita da II Guerra Mundial, com referências judiciosas, quase realísticas e relatos ficcionados cativantes do que então, por essa época, nessa cidade se vislumbraria no campo social dum entrecruzar de línguas e de culturas…
Aliás, a abordagem deste tema: o corte de lenha, em toda a ilha – achas e cacetes – com maior expressão na área da Madalena, porque aí atingia uma expressão quase senão mesmo inédita duma exportação, entre ilhas, de um combustível renovável. Certo é que, durante a minha infância foi o único combustível conhecido e comercializado – a lenha, em achas – e dessa actividade recordo alguns bons homens de São João, quase todos já desaparecidos. Mas, também é verdade, que dessa gente laboriosa e empreendedora, da Criação Velha, desta actividade, quase ou mesmo nunca ninguém falou. Ainda são muitos, como eu, que recordam a rampa da Madalena plena de actividade madrugadora, antes e depois das lanchas de passageiros, no arrear e carregar dos barcos com lenha para o Faial.
O Sr. Prof. Ruben Rodrigues foi professor nas Lajes em 1958. Depois foi professor na Madalena e aí ingressou nos quadros da Fundação Calouste Gulbenkian, entidade que, durante muitos anos, manteve na ilha uma Biblioteca Itinerante. Foi vereador no município da Madalena, integrou a comissão administrativa da Câmara da Horta e foi, em 1993, eleito presidente da Assembleia Municipal da Horta. Foi co-fundador do C.R.P. da Madalena e como seu treinador o encontrei, na minha adolescência, muitas vezes a treinar essa sua equipa nas Lajes, antes de ter sido construído o campo da Madalena, hoje no mesmo sítio, mas com outra dimensão e qualidade. Foi ainda presidente do Angústias Atlético Clube, da Horta. Jornalista de “pena exuberante” foi relevante e intrépido director do jornal “O Telégrafo”, durante muitos anos e, mais tarde, foi chamado pela Diocese para “antecipar” o previsível encerramento do jornal “Correio da Horta”, mas não o deixaram lá permanecer, e foi o que se viu depois da sua saída…
Representou a Região Autónoma dos Açores no “Conselho de Opinião” da RTP. Foi mandatário no Faial da segunda candidatura de Mário Soares à Presidência da República. Foi distinguido pelo município faialense como jornalista reivindicativo em prol da sua terra.
Em 2004 (?), o Presidente Dr. Jorge Sampaio, confere-lhe o Grau de Oficial da “Ordem do Mérito” da República Portuguesa.
Ruben Rodrigues, o Professor, o cidadão e o amigo é dos poucos cidadãos que conheço que assume modestamente esta maneira única de estar na vida como um Homem do Pico e do Faial. Eles são muito poucos e quase nenhuns nascidos no Pico.
Aqui expresso publicamente, e mais uma vez, a minha respeitosa e modestíssima homenagem ao Sr. Professor Ruben Rodrigues.
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