O verão é a estação mais apetecida do ano. Todos a aguardam com espetactiva e ansiedade. Os funcionários, os trabalhadores, os estudantes e até os que não têm profissões ou ocupações específicas.
Mas é a juventude que aguarda com maior ansiedade a estação calmosa. O tempo de lazer… o mar e os banhos… as noites passadas nas boites… o dormir sem horários…
E aqueles que levam uma vida de trabalho intenso, com quanto entusiasmo não aguardam a chegada das férias para uns dias de repouso! De refazer energias… de visitar as terras de origem… de visitar parentes e amigos…
Recordo esses tempos passados. Estava longe de casa. Os transportes eram quinzenais e quando o tempo permitia. Não havia possibilidades de vir a casa pelas curtas férias do Natal ou da Páscoa. Só no verão, ou férias grandes como lhes chamavamos.
No entanto era uma alegria quando, pelo mês de Maio, aparecia um barco do Pico – a “Calheta” ou o “Ribeirense” e, depois, o “Andorinha”, pelo Sul. Mais tarde, o “Santo Amaro”, o “Terra Alta”e o “Espírito Santo”, pelo lado Norte.
Um dia de festa, uma alegria indiscritível. Receber uma carta, uns pequenos “mimos”, vêr gente nossa conhecida, saber notícias da terra. Uma vida nova, de esperança, nascia em nós: as férias estavam a chegar e a vinda a casa aproximava-se.
Hoje, decorridas tantas dezenas de anos, ainda recordo com um misto de saudade, esses recuados tempos em que tudo era difícil e por isso mesmo mais apreciado.
Os barcos do Pico!… Que alegria causava o seu aparecimento na baia! E não só aos picarotos que viviam afastados da Ilha. Também os outros vinham até o Pátio da Alfandega, debruçavam-se nas amuradas da baia, assistiam ao tráfego da pequena lancha de bordo a transportar para terra os passageiros e alguma mercadoria. Chegavam-se, depois, ao cais de desembarque para cumprimentar o Mestre ou algum conhecido, porque o barco não fazia viagem directa do Pico à Terceira mas passava pelos portos de S. Jorge, até pelas Fajãs, onde tomavam carga e passageiros para a “cidade”.
Que excelentes serviços não prestaram às ilhas do Arquipélago os pequenos mas seguros Barcos do Pico! E foi assim em anos passados. Quando os barcos, iates e chalupas – não eram equipados com motores mas apenas de velas, navegavam no verão entre as ilhas e mantinham um intercâmbio comercial que era bastante proveitoso. Normalmente, eram as casas de atacado que forneciam as mercearias do Sul do Pico, num regime de crédito que facilitava a vida das gentes picoenses. Os fornecimentos do Inverno eram liquidados no verão seguinte. E, dizia-me um velho marinheiro: Podia trazer toda a loja do B. Simões, que só pagava no outro ano quando recomeçavam as viagens. E os compromissos nunca falharam!…
Vale a pena recordar os velhos tempos . Tudo era difícil mas, mesmo assim, havia uma paz e tranquilidade que agora se não consegue. Respeito pelos compromissos assumidos. Não havia tinta nem papel. Bastava a palavra de homem do Pico.
Viajei na Calheta e nos barcos do Pico. Viagens difíceis por vezes mas feitas com uma alegria indiscritível. Vinhamos para férias. Gozar junto da Família os escassos meses que nos eram concedidos. E estar na terra que nos foi berço e que jamais deixamos de amar. Recordo uma viagem na Calheta de Angra para o Pico. Preferimos desembarcar em Santa Cruz e caminhar a pé até às Lajes – não havia automóveis que pudessem circular naqueles velhos caminhos . Mas, no ano seguinte, tudo estava esquecido e eram capazes de repetir a aventura.
Hoje é tudo diferente, tão diferente, que se já esqueceu o passado e o quanto sofreram, durante séculos, as gentes do Pico.
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