DO CANADÁ AO BRASIL POR TERRA - DIA 32 E 33 |
“ENTALADOS” NO CANAL,
“PRISIONEIROS” NO PERU!
Vasco Oswaldo Santos (Texto e fotos)
José Ilídio Ferreira (Fotos)
Adiaspora.com
António Perinú (Texto e Fotos)
Sol Português
Miraflores, Lima, Peru, 5 e 6 de Novembro – Pois é, isto já cheira mal. Mesmo muito mal. As verdadeiras “patadas”, imperdoável e sucessivamente praticadas pela companhia marítima Evergreen, no Panamá, não deixam de se fazer sentir aqui e agora, num país de Alfândegas extremamente rígidas e burocráticas como são as do Peru.
O caos das inspecções - Editor aliviado
Na segunda-feira, conduzidos pelo nosso fidelíssimo D. Diego, apresentámo-nos nos escritórios da Greenandes, em Callao, como nos foi solicitado pelos extraordinários funcionários Angel Pérez e Lisbeth Chu Rodriguez, incansáveis na tarefa de nos fazer esquecer as peripécias panamianas. Qual quê? As coisas continuaram a complicar-se à medida que um problema ia sendo resolvido. Neste início de semana foi uma bronca monumental: À saída de Colón, o escriba destas linhas alertou a famigerada Ana Raquel para o facto de grande parte das nossas bagagens seguir viagem dentro do carro. Uma viagem de 45 dias, em condições por vezes inconfortáveis exige bastante roupa. E alguns outros extras nem sempre possíveis de transportar de avião. Respondeu a senhorita que não tínhamos de nos preocupar e a Guia de Transporte (Bill of Lading) apenas mencionava o carro. Aqui, as autoridades portuárias levantaram problemas com os nossos pertences pessoais não declarados. Resultado: um requerimento assinado pelo Zé para denunciar a asneira de Colón, solicitando a emissão de uma segunda Bill of Lading só para a bagagem. Tudo foi tratado cuidadosa e zelosamente pelo Angel e pela Lisbeth. Seguiu-se, graças à sua influência, uma reunião privada com um dos chefes principais da Alfândega, em Callao, senhor jovem, circunspecto, fleumático mas correcto e desejoso de ajudar – mas absolutamente de acordo com a lei vigente. Permitiu o requerimento, mandou que deste lhe fosse comunicado o número, por telefone, para que o despacho entrasse de imediato no computador. Assim se fez da parte da tarde. De seguida, voltámos ao depósito onde se encontrava o contentor a fim de tirar o carro, separar a bagagem nele contida – formando um fardo separado com Bill of Lading própria – transformando um volume em dois de identidade separada e distinta.
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Escriba extenuado - Indo embora... que amanhã há mais!
Para nosso alívio, nada havia sido mexido, e o carro chegou impecável, tal como havia partido do Panamá. O oficial que fotografou o carro e o contentor – agora a digitalização permite operar maravilhas... – e eu mencionei-lhe o facto de ter os meus medicamentos (que já não tomava como devia ser há 5 dias, quando se acabaram) numa caixa de cartão, sem acesso, ali à vista. Que não, aquiesceu, nada poderia ser tocado mas os medicamentos seriam uma excepção. E deixou-mos tirar da caixa!!!
Os Telhados de Callao
Anoitecia quando voltámos a Miraflores, com a promessa reservada de podermos desalfandegar tudo no dia seguinte, mas bem cépticos a despeito da esperança. Pelo sim e pelo não, decidimos que seria melhor ir escrevendo para mandar as coisas para Toronto, não fosse o diabo tecê-las. Mas é que teceu mesmo! Então não é que nos foi exigido o pagamento de mais de 500 dólares mais para despesas de despacho, condição sine qua non para recebermos as nossas coisinhas, já pagas e repagas?
Rua de Callao - Sorte malvada....
Os escribas dormiram à pressa – what else is new? – saltando do leito às seis da manhã para se aproveitarem as primeiras horas do dia, fresquinhos da cabeça. Pelas 9h30, saíam Vasco e Zé, de novo, para Callao, na esperança, mesmo que vaga, de recebermos as nossas coisinhas. Pois, tá-se mesmo a ver o que aconteceu, né? No escritório, a equipa da Lisbeth Chu (ao telefone) e do Angel (pessoalmente), a que se juntou a de outro jovem, o António Rodríguez, subdividiu-se pois o departamento da Alfândega que trata do carro nada tem a ver com bagagens pessoais e era necessário um despacho duplo e paralelo, com nova petição.
Vasco na Segunda-feira - Zé na Segunda-feira
Desesperados, tomámos conhecimento que o nosso caso era “virgem”. Ou seja, abriu precedente no funcionamento da Alfândega de Callao, preparada para funcionar em pleno no despacho e recebimento de mercadorias, importação de carros para ficarem no Peru, mas absolutamente desprevenida e impreparada para receber um carro de passagem para outro país, para circulação temporária. Daí estes atrasos e confusões acrescentadas, correctas e aumentadas como a errata de um livro.
Zé pouco satisfeito
Com a irritante – mas lógica – interrupção para a hora de “refrigério”, como aqui se chama o intervalo de 90 minutos para almoço, nova reunião com a alfândega, às 14h00, aceitação de tudo e autorização para a inspecção alfandegária dupla, a carro e pertences. No processo de nomeação do inspector, um funcionário com cara de mauzão de filmes de bandoleiros mexicanos – apropriadamente apodado de Don Paco fez-se difícil e o Zé protestou. Subitamente aparece um cavalheiro urbaníssimo a declarar em voz alta, perante os seus próprios funcionários, que este serviço era gratuito, igual para todos e que os funcionários estavam bem pagos. Quando o Zé lhe inquiriu se se devia, com todas estas dificuldades, considerar-se prisioneiro no Peru, em razão do “encurralamento” do Canal do Panamá, o senhor Barrancas – assim se chamava o chefe de serviços – retorquiu: - Não me faça entrar por esse caminho! – e, acto contínuo, arrancou a papelada das mãos do funcionalismo de guichet e disse que se encarregaria pessoalmente do caso.
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O nosso contentor
Entretanto, o Angel havia assegurado a inspecção das bagagens ainda de tarde. O António Rodríguez levou-nos para a rua pois deveríamos ir no táxi do Diego para o armazém, levando connosco o inspector alfandegário. Para nossa surpresa este era, nem mais nem menos que o chefe Barrancas, ele próprio! Na Imupesa, onde se encontram os armazéns, de tanto entrarmos e sairmos, abrandou a pressão dos próprios serviços de segurança, que já nos despachavam com os famigerados cartões coloridos, de entrada e saída, distribuição de capacetes e revista das bolsas. E até nos sorriam pressurosos...
Prontos para a abertura
Escurecia quando as inspecções ocorreram simultaneamente. Tudo em ordem. Mas só da nossa parte pois que os computadores da empresa foram abaixo e todo o processamento que restava foi manual: salvo-condutos, selos de circulação para o pára-brisas do Mercedes, assinaturas, etc. Voltámos a Callao com o Sr. Barrancas risonho e intocável. Disse que amanhã de manhã, entre as 9h30 e as 9h40 a documentação estaria pronta para podermos receber o carro e empreender viagem. Só que os nossos amigos da Greenandes foram menos optimistas e preveniram-nos que só de tarde deveremos ter o carro nas mãos. Acontece ainda que ele sairá só, do entreposto alfandegário, sem bagagens, estas transportadas para a rua numa paleta transportada por uma empilhadora mecânica, bem separadinha, como manda a lei!
Quebra do selo
O carro!!!
Uma achega para que os nossos leitores se apercebam de certos pormenores irritantes nesta nossa saga. Parecem irrelevantes mas, ao fim de certo tempo, dão-nos cabo da paciência: a gente trouxe roupa para 45 dias de viagem. Como estamos interditados de tocar seja no que for, mesmo depois da inspecção alfandegária, o Zé anda há 3 dias com a mesma camisa, este escriba esteve 5 sem medicamentos e as calças que veste, estão puídas de tanta lavagem, que os calções não se podem vestir com o frio. A excepção amável para os medicamentos não foi tornada extensiva a uma muda de roupa que fosse para cada um de nós. E mais, todas estas visitas à Greenandes, Alfândega e Imupesa, note-se que cada um destes sítios ficam a uma distância média de 5 km entre si, em estradas pejadas de camiões de contentores, trânsito desordenado e zonas onde até os locais se apressam a trancar as portas do carro. A rematar, a gente anda nisto transportando ainda gratuitamente todos os funcionários com quem contactamos, ao ritmo de 100 dólares diários em táxis. E como sardinhas em lata.
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Para a história - António Rodriguez, José Ferreira, Lisbeth Chu Rodriguez,
Angel Peréz Prado e Vasco Oswaldo Santos.
De regresso ao escritório da companhia, um pedido da Lisbeth Chu e do Angel para tirarmos uma fotografia juntos com o António Rodríguez, um gesto, de boa vontade inenarrável, envergonhados que se confessam pelos erros cometidos pelos seus colegas no Panamá. E na hora de encerrarmos este diário, já bem depois da meia-noite, prometemos dizer algo amanhã, caso tudo corra como deve ser...
Palavras de agradecimento
Últimas palavras recebidas de encorajamento e apoio. Como habitualmente colocamos apenas as das pessoas que se nos dirigem pela primeira vez: Adelino Cabral, Massachussets, EUA; Eng. Manuel Joaquim Neves da Costa, Presidente da Câmara Municipal de S. Roque do Pico, Açores; José Mário Lopes, Faial, Açores; Manuela Sequeira, Toronto, ON, Canadá; Dra. Dalila Silva, C.M. Horta, Faial, Açores; Presidente Carlos César, Governo Regional dos Açores; Dra. Maria de Fátima Vargas, Faial, Açores; Dr. António Costa, Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Portugal; Maria Inês Pinheiro, Faial, Açores; Alberto Ferreira, C.M. da Horta e Raquel Domínguez, Uruguai.
Bem-hajam pelo cuidado!
Amigos leitores! Se empreendermos viagem amanhã, com um atraso de duas semanas e com expectativa de chegarmos ao Brasil a 18 ou 19 de Novembro, é possível que estas páginas do Diário de Viagem não vos cheguem com a regularidade prevista. Temos ainda 10.000 km pela frente e o tal deserto chileno, dentro de dois ou três dias. A ver vamos, como dizia o cego da parábola!
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