DO CANADÁ AO BRASIL POR TERRA - DIA 6/7 |
EXEMPLOS DE CORRUPÇÃO, QB,
REPETIDOS TRÊS VEZES EM DOIS DIAS!
Vasco Oswaldo Santos (Texto e fotos)
José Ilídio Ferreira (Fotos)
Adiaspora.com
António Perinú (Texto e Fotos)
Sol Português
San José, Costa Rica, 11 de Outubro – Outra noite de chuvas torrenciais. De manhã, os nossos “despachantes”, Valdemar e Rafael, acompanharam o Zé Ferreira e o António Perinú ao México para obterem dinheiro da caixa ATM que não existia na Guatemala. Aí começaram os trâmites alfandegários exercidos sobre a importação dos carros, mesmo que de passagem por um só dia: fotocópias de documentos (voltámos ao México para as fazer), registo pormenorizado dos documentos do carro, seguros, etc. Repentinamente, descobre-se que não tínhamos carimbos de entrada ou saída no México. Explicámos que ninguém nos havia mandado parar. Os guatemaltecos, educados mas cumpridores, determinaram que deveríamos voltar ao México e pedir carimbo de saída. Assim fizémos, uma vez mais. O oficial mexicano notou que não tínhamos a cópia do visto de turista que nos deveria ter sido vendido à entrada. Pois não. Ninguém no-lo solicitou em Nuevo Laredo!!! Bom, o oficial os poderia emitir ali contra o pagamento de 800 pesos. Já não tínhamos mais divisas mexicanas. O senhor fardado e fino, propôs que pagássemos então em dólares americanos (80). Pagámos... e o oficial prometeu que ele próprio preencheria mais tarde as famigeradas papeletas. Que não acreditamos haja feito. Tanto mais que não tínhamos recibo, né?
Carimbados de fresco, os passaportes voltaram connosco para a Guatemala sobre uma ponte com um riacho armado em rio castanho e revolto sob a chuva contínua. E lá entrámos, apressados, seguindo por estradas de muito boa pavimentação – disso sabíamos – a permitir uma velocidade razoável fora das povoações. Algumas delas a lembrar Sintra, onde as copas das árvores de ambos os lados das estradas armam túneis aprazíveis de frescura.
O sol apareceu pelas 11h30 sobre a Pan-Americana CA2. Nas povoações, nunca assinaladas por dentro, vendas pobres, muito coloridas, camiões poluentes de fumos negros e cheiro a refinaria de petróleo. Muitas lombas surgem nas estradas sem aviso para redução da velocidade. Vacas, muitos cavalos, porcos e cabras, competem com os cães vadios a ração possível. Gostaríamos de ter ido visitar a Cidade da Guatemala e, especialmente, a Vieja Guatemala histórica. Teve de ficar para a próxima, dado que a data limite de 12 de Outubro nos acenava a urgência de estar em Colón (Panamá) pelas 8 horas da manhã. Em Escuintla um pequeno atraso: as estradas que seguem para a capital têm o mesmo número e a sinalização não menciona os destinos principais. Em Taxisco, onde queríamos passar, a chuva aumentou de intensidade. Placas quilométricas ou sinalizadoras são peça de museu em cima e/ou dentro das povoações. A condução dividida entre o Zé e o Luis continuou a ser a base da nossa tranquilidade. E é importante assinalar isso. Porque uma boa equipa é assim que funciona e produz resultados. O escriba destas linhas e o Perinú que o digam por poderem preocupar-se apenas com anotações e observações que, ao fim do dia, tanto ajudam na composição final do texto e das fotos. Em que o Zé contribui largamente, fotografando tudo o que mexe, embora ao volante...
If it is 3 pm it must be El Salvador…
Foi isso mesmo, tal como no filme que satirizou há 30 anos as visitas dos americanos pela Europa. E se nós conhecemos a nossa geografia, sem ter de entrar em guerra com ninguém, ou invadir quem quer que seja, podemos parafrasear a metáfora. Eram 15h00 quando, atravessada a Guatemala, entrámos em El Salvador, o primeiro dos países a atravessar, bem pequenos de área e onde se perde mais tempo nas burocracias fronteiriças, mesmo exceptuando a necessidade de vistos, bastando que o proprietário do carro – no nosso caso, o Zé Ferreira – leve no seu passaporte, carimbos enormes com o registo repetido do automóvel. Neste caso específico, um acordo entre a Guatemala, El Salvador, Honduras e Nicarágua, permite um ligeiro abrandamento (teórico, é certo) nas inspecções alfandegárias. Os “funcionários espontâneos”, peritos em malabarismos e jogo de cintura, lá vão auxiliando pois que, descaradamente, entram pelos escritórios dentro e passam a pasta aos parceiros do outro lado da fronteira, poupando algum tempo a quem tenha o azar de viajar de automóvel. Por outras palavras, é muito mais importante a documentação de um carro que a das pessoas. De El Salvador, ficou-nos a imagem imunda das “casas de banho”. O que é triste e indica que se tivéssemos tido tempo para visitar a sua cultura certamente que não mencionaríamos este reparo.
Pelas 17h15, com procedimento idêntico, e debaixo de chuva para não variar, saímos para as Honduras com o aviso de que tínhamos até às 16h30 do dia seguinte para tirar o carro do país, sob pena de uma multa de US$1,100.00. Os passageiros podiam quedar-se por 30 dias. Ou seja: um automóvel vale aqui mais que um ser humano!
Pela meia-noite, havíamos percorrido uns meros 452 km em 14h00.
Uma “directa” geral
Mas à meia-noite a gente continuava a rodar, debaixo de bátegas de água, claro, mas em piso bastante bom. Eram 2h30 da manhã quando franqueámos a fronteira das Honduras. Já no dia 11, bem entendido, confiantes de podermos atingir Colón, à hora requerida, na manhã do dia seguinte.
A despeito de a noite se apresentar bastante escura, e de a sinalização em El Salvador ser muito boa, o facto é que, nos cruzamentos cruciais, era inexistente. O que, adicionado ao factor de estradas convergentes com o mesmo número, nos levou a que passássemos pertíssimo do atalho para o posto fronteiriço com as Honduras sem o lobrigar. Na localidade de San Miguel descobrimos que já havíamos passado Santa Rosa, a última localidade antes da fronteira de Amatillo. Numa rua que acede à estrada militar, deparámos com uma patrulha de polícias encapuçados, armados até aos dentes, a quem procurámos se estávamos no caminho certo. Acabou por ser um jovem oficial de rosto descoberto a dar-nos as informações precisas. Eram precisamente 2h30 quando se nos deparou um posto de fronteira no meio de uma lixeira indescritível. A fronteira estava fechada, os camionistas dormiam, assim como a maioria dos “despachantes”, que também pernoitam debaixo dos camiões da clientela. Como éramos passageiros de uma viatura particular, conseguimos que dois destes jovens nos facilitassem a passagem junto às autoridades. Por dinheiro até arrancaram ao sono dois oficiais alfandegários que assinaram a documentação que nos permitiu entrar no país hondurenho. Enquanto aguardávamos o desfecho desta diligência, deparámo-nos com o “comércio” local encerrado. Havia dois bares que nos chamaram a atenção porque sobre a porta de cada um deles se ostentavam os nomes de ASPIRINA e ALKA-SELTZER, respectivamente. Tratando-se de dois antros de consumo de bebidas não aquáticas, demos largas às frustrações do dia fazendo palhaçadas para as máquinas fotográficas. Confessemos que rimos a bom rir. Oh, se rimos!
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O bar Aspirina
A tasca Alka Seltzer
Com a documentação em ordem seguimos viagem por uma boa estrada a despeito de, por um triz, não termos chocado com três enormes vacas deitadas na faixa contrária à nossa. Mas o bom piso foi de pouca dura: quase que a menos de 1.000 metros da fronteira, uma patrulha policial, verificou todos os nossos documentos em plena noite. Incluíndo a carta de condução do Luis, que este havia deixado no bolso da sua jaleca, na bagageira do carro, como ele chama ao colete. Sorridente, o guarda mandou-nos seguir para, 500 metros adiante, outra patrulha nos mandar desviar de umas obras em curso. O desvio era uma autêntica mescla de picada e superfície lunar, de crateras cheias de água, e que nos chocalhou até podermos, uns 300 metros – que nos pareceram 3.000 – mais adiante retornar à via principal. Em estrada que contorna o golfo da Nicarágua entrámos neste país pelas 7h30 da manhã de 11 de Outubro, depois de uma consulta a 3 estações de serviço a colmatar a brecha da falta contumaz de sinalização rodoviária nos locais cruciais.
Diga-se que o posto fronteiriço da Nicarágua contrasta com a desordem do de El Salvador, quer pela limpeza, ordenação dos edifícios e burocracia reduzida, com a excepção de se ter de voltar às Honduras para fazer as fotocópias, na ausência do funcionário “nica”.
Rompeu o dia com uma pequena pausa nas chuvas: estradas boas e limpas, pouco movimento de viaturas até Manágua, a capital. Menor teor de sociedade de consumo nas lojas das gasolineiras mas com um bom frango frito e iogurte de qualidade a constituirem o nosso pequeno-almoço. Também havia bons vinhos chilenos à venda e a bela “Flor de Caña”, um rum de qualidade superior, que Cuba comprou por atacado na altura da revolução sandinista, para apoio aos rebeldes.
A caminho da capital, Manágua, atravessámos enormes arrozais e outras áreas essencialmente agrícolas (cana de açúcar, banana e plátano). Num país com um grande rebanho bovino, a moeda corrente é o Cordova que se cambia (e aceita) livremente a 17 unidades por dólar dos EUA.
Porque se está em plena época eleitoral, os grandes cartazes com o líder Daniel Ortega são omnipresentes, especialmente na capital. De lembrar o percurso deste presidente revolucionário: liderou a guerrilha Sandinista que ganhou. Foi quasi-ditador mas permitiu eleições livres. Perdeu-as a favor de um membro da importante família Chomorro, Violeta, directora do diário oposicionista La Prensa. Mas nas eleições seguintes, no meio de uma eleição perfeitamente democrática e plena de observadores internacionais, voltou ao poder aceitando o pluralismo democrático.
A cidade de São Bento de Manágua, que atravessámos perto das 11h00, tem casario relativamente baixo, tal como toda a América Central (os sismos e erupções vulcânicas são frequentes, bem como os ciclones). Foi próximo de Dario que as chuvas derrubaram o tabuleiro de uma ponte, uma ratoeira para os automobilistas.
Pela porção da Pan-Americana, via Jinotepe, aproveitámos um pouco de bom tempo, para aumentar a velocidade de cruzeiro, atravessando grandes herdades de gado bovino e cavalar, atingindo, cheios de optimismo, a localidade de Peñas Blancas, posto fronteiriço para a Costa Rica. Mas acabou por ser debaixo de chuvas diluvianas que fomos obrigados a interromper a viagem e a hipótese de colocar o carro a bordo do navio-contentor devido ao acidente já referido. |