Professor universitário, ensaísta, escritor e dramaturgo, Onésimo Teotónio de Almeida não cessa – em boa hora o vá sempre fazendo! – de nos surpreender com a frescura da sua acuidade satírica.
Desta feita, com o sugestivo título de “Aventuras de um Nabogador & Outras Estórias-em-sanduíche”, Onésimo Teotónio Almeida veio de Providence, R.I. (EUA) a Toronto - com o patrocínio da Brock University (localizada na Península de Niagara, Ontário, Canadá), através da sua docente, Dra. Irene Blayer, para o apresentar.
A cerimónia ocorreu na “Galeria Almada Negreiros”, do Consulado-geral de Portugal em Toronto, na passada quinta-feira, dia 27 de Setembro, numa sessão presidida pela Dra. Maria Amélia Paiva e tendo como apresentador o Professor Francisco Cota Fagundes do Departamento de Línguas , Literaturas e Culturas, Espanhol e Português da Universidade de Massachussetts, em Amherst.
Com um brilhantismo académico, que Onésimo de Almeida, na sua vez se aprontaria a desmistificar, Cota Fagundes fez uma elaborada análise da obra do colega da Brown’s, de grande rigor, mas, porventura, muito contrastante com a “simplicidade” com que o nosso “nabogador” nunca deixa de evidenciar.
|
O livro, que não tínhamos lido à altura da apresentação mas que já nos deliciou através dos primeiros capítulos. Segundo o próprio autor se apressa a esclarecer, “contém estórias que ficaram para trás, depois foram-se juntando outras, muitas mais, durante os anos da velhice do século, algumas das quais eu fui contando em crónicas e outras apenas nos serões, quando me dá para massacrar os convivas, que isso do prazer de contar uma estória (não escrevê-la, pois prefiro de longe falá-la, é em mim pecha bem antiga, inveterada. Vou porém ficando com menos paciência e por isso jurei que havia de fazer o sacrifício de pô-las por escrito, para não me tornar muito maçador com a idade. Quando me der a tentação de contar, vou, compro o livrinho e ofereço”. Isto é o homem no seu melhor, o amigo que conhecemos de longa data, o escritor de fina lavra que deixa perpassar pela sua arte satírica uma invejável cultura e espírito de observação de que poucos se podem orgulhar.
|
O livro acarreta doze estórias apenas. Mas doze estórias a não perder, mesmo que, como Onésimo sempre disse, existam dois negócios no mundo votados ao mais completo dos falhanços: vender frigoríficos no Alaska e livros na comunidade portuguesa... Nalguns deles perpassa até uma referência a Gabriel Garcia Marquez, prémio Nobel da Literatura, monstro sagrado das letras universais (e colômbianas). Diz Onésimo que, “moral, não têm nenhuma”. Mas até terão. Para isso o leitor deve levar o livrinho para casa e deliciar-se, que literatura desta é cada vez mais rara na língua de Camões. Para se ler Onésimo não é preciso a gente deitar-se num divã de analista ou psicólogo. Com arte, graça, ironia, e um espírito de observação constantes de coisas e de pessoas... ele transmite muito bem o que quer dizer a sério, logo que o leitor pare de gargalhar e consiga pensar.
Mais palavras não são aconselháveis porque o autor destas linhas não é crítico literário, nem a isso tem pretensões. Por isso, para contrariar a tal difícil acção da outra “impossibilidade” que acasala com a venda dos frigoríficos no Grande Norte Branco (Great White North), aqui se encerra o trabalho com um excerto do oitavo conto, a “Estória pouco original do medo”, baseada no incidente da Air Transat que só não foi uma tragédia horrorosa porque, nessa madrugada, a caminho da Terceira, o Diabo estava de folga...
“No sacro solo eram abraços de pranto, lágrimas de alívio e Graças a Deus Salvador e ao seu filho na terra, Piché levado agora aos ombros. Só um casal – conta o piloto – discutia estranha e desalmadamente. A minutos da aterr(oriz)agem, e convencido da morte eminente, um marido em pânico confessara à mulher as suas infidelidades com a irmã dela.”
Voltar para Livros |