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A ACAPO e a Semana de Portugal 2006
HÁ COISAS QUE PRECISAM SER REPENSADAS NA COMUNIDADE
MAS A EDIÇÃO DESTE ANO EM NADA NOS ENVERGONHOU
Vasco Oswaldo Santos
Adiaspora.com
O primeiro impulso do jornalista foi o de fazer
uma reportagem cronológica da miríade de acontecimentos
que preencheram o programa da Semana de Portugal, organizada
pela ACAPO (Aliança dos Clubes e Associações
Portuguesas do Ontário. Todavia, repensei no formato
e pareceu-me que seria mais um relato a vir a público,
um formato, um pouco estafado mas obstinadamente tido como incontornável.
E que não o é.
A comunicação social comunitária
é quase toda semanal. Não existe um quinzenário
ou uma revista mensal que se dedique a artigos de observação
e de conjunto de acontecimentos de longa duração
como é o caso desta lusa “semana”. Por outro
lado – e comentei-o há dias com o director do nosso
maior jornal comunitário –, com a experiência
que absorvi nestes anos de acompanhamento de notícias
e eventos, se poderia escrever esta reportagem, ou outra similar,
durante três anos seguidos, da forma mais convencional.
Depois, bastaria, no quarto ano, publicar a do primeiro ano,
mudando nomes datas e locais. No ano seguinte far-se-ia a mesma
coisa utilizado o texto do segundo ano, e assim sucessivamente.
A maioria das pessoas não notaria e haveria até
quem dissesse: a reportagem deste ano foi a melhor de sempre!
Posto isto vamos ao que se destacou este ano.
E faço-o pela ordem da importância na opinião
pública e na visibilidade perante a informação
em geral, que não apenas a comunitária, uma vez
que órgãos canadianos voltaram a incluir o “passeio
anual de Portugal” pela Dundas West nas suas páginas
e noticiários electrónicos.
Não foi a maior parada de sempre mas
esteve muito longe de ser das menores. O conteúdo quase
nada mudou se exceptuarmos a presença vibrante do grupo
“Não Há Ilegais”, uma coligação
internacional que pode gabar-se de ter tirado o vento que enfunava
as velas da política de imigração do bote
federal. E a de uma visibilidade melhor aproveitada da Luso-Can
Tuna, estamos em crer, a que se juntaram os instrumentos tradicionais
portugueses, coma gaita-de-foles tocada por Nuno Cristo, uma
novidade bem pensada. Finalmente, e isto é como o doce
que acompanha o fim de um banquete, a presença de uma
delegação da associação dos angolanos
de Toronto, que vivem em casa separada, porque tanto lutaram,
mas sem deixarem de ser nossos irmãos.
O que marcou realmente a parada não
foi tanto quem desfilou, mas sim quem emoldurou o percurso:
as nossas gentes já em três gerações
distintas, com as mais novas evidenciando um patriotismo que
muitos já nem conseguem expressarem em português,
mas exibindo camisolas da equipa de Portugal, bonés,
cachecóis, bandeiras – muitas bandeiras verde-rubras.
Aliás, quase que em cada esquina se vendiam, em bancas
improvisadas e coloridas, todos os símbolos da participação
portuguesa no “Mundial de 2006” a decorrer na Alemanha.
Mas essa “solidariedade” teve companhia por parte
dos comerciantes da área que não se escusaram
a colocar sobre as lojas as bandeiras de todos os países
participantes – caso do Talho do Fernando – ou somente
as dos três participantes lusófonos, Angola, Brasil
e Portugal – caso do Talho Pavão. Bonito!
Seria injusto não referenciar a presença
de um núcleo de antigos combatentes da Guerra Colonial.
Mas não nos parece curial perpetuar a mostra pública
de um dos períodos mais tristes do século XX português.
Isto com todo o respeito por quem para lá foi obrigatoriamente
mandado. Acho-me insuspeito no comentário pois servi
45 meses nas fileiras do Exército Português, de
Agosto de 1965 a Maio de 1969, embora sem pôr os pés
em qualquer território colonizado.
Voltando ao evento maior, houve momentos em
que a alegria e o entusiasmo eram mais evidentes da parte de
quem assistia do que daqueles que desfilavam, frequentemente
com cara de frete, no cumprimento de um ritual que está
a pedir uma reformulação urgente.
Não cabe aqui, explicar as eventuais
razões, por exemplo, para uma participação
maior das bandas de música que temos no sul do Ontário.
Isso será feito brevemente numa entrevista a José
Eustáquio, já alinhavada. Porque tudo isso passa
pela figura do Joe, por mais controversa que ela possa ser.
E é!
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Saliente-se que a ACAPO também está
a atravessar a sua grande crise. O que não é de
admirar numa conjuntura em que o associativismo comunitário
está, aqui e ali moribundo, como há alguns anos
vimos a manter e que nada ainda o desmentiu, algo que nada me
agrada pois que gostaria de não ter razão. Mas
a verdade é que a ACAPO, à boa maneira das nossas
gentes, se habituou a viver à sombra do seu líder,
não se vislumbrando quem o queira suceder. Porque na
vida, tudo tem a sua época, o seu momento, a sua vitalidade.
E a mudança é não só
salutar como necessária para que o futuro possa ser assegurado
com novas iniciativas e, sobretudo, com uma vitalidade renovada.
José Eustáquio, ao liderar as comemorações
da Semana de Portugal, quase que por obrigação,
está a dar-nos a mensagem – correcta – de
que é difícil passar o testemunho numa comunidade
que prefere esperar que as pessoas e as instituições
se esgotem, se cansem, se derrubem, para depois aceitar o surgimento
oportunístico – que não natural –
de “cavaleiros brancos” salvadores das “pátrias”
e das instituições. Não fora o denodo que
o caracteriza, e nesse aspecto nunca o criticámos porque
seria uma injustiça, não teríamos sequer
semana de Portugal. Porque se em tantos clubes e associações
que constituem a Aliança não se consegue uma pessoa
para a liderar, como se pode esperar que apareça quem
assuma a responsabilidade pesada de organizar esta tarefa que
é a das Comemorações do nosso dia nacional?
Um Fórum importantíssimo
que a comunidade “votou com os pés”
São desgraçadamente assim as
nossas gentes! Ao abrigo da programação da Semana
de Portugal, o Conselho das Comunidades promoveu um Fórum,
marcado para 2 de Junho na Casa das Beiras em Toronto. Objectivo?
Muito simplesmente auscultar a comunidade quanto às suas
reivindicações junto das autoridades portuguesas
através dos conselheiros eleitos e, porque estas coisas
devem sempre funcionar como uma rua de dois sentidos, participar
também aos luso-canadianos qual o resultado das suas
iniciativas, quer a nível local quer nacional, mesmo
até ao âmbito mais alargado do continente norte-americano.
E é necessário não esquecer que os nossos
conselheiros se reúnem frequentemente com os colegas
dos Estados Unidos uma vez que muitas das reivindicações
são paralelas.
E quando se esperava que um número considerável
de pessoas respondesse à iniciativa, a desilusão
foi total. Presentes cinco conselheiros, três jornalistas,
uma sindicalista, três dirigentes da Casa das Beiras e
dois cidadãos interessados.
Em representação do Consulado-geral
de Portugal em Toronto, ninguém. Ou seja, um abandono
total dos conselheiros e comunidade em geral, diria mais: um
ostracismo anunciado e já enraizado. Que só quem
não liga mesmo a estas coisas é que ainda não
se apercebeu que os sucessivos governos portugueses não
ligam patavina ao Conselho nem aos conselheiros das comunidades,
ouvem “por frete” a sua Comissão Permanente,
promovem uma reunião de quando em vez na Assembleia da
República e, como aconteceu há dias na Alemanha,
por ocasião da abertura do Campeonato do Mundo de Futebol,
o Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, ofereceu
um almoço para 1.000 jovens e ignorou as tentativas dos
conselheiros que o queriam encontrar.
Na altura em que este Fórum ocorreu,
isso ainda não tinha acontecido. Mas tal facto em nada
mudou a frustração com que a falta de resposta
comunitária “premiou” os esforços
que inglória mas teimosamente vão desenvolvendo
no sentido chamarem a atenção para a situação
caótica do ensino da língua e da cultura portuguesa
por estas paragens e pelo resto do mundo. Por outras palavras,
por toda e qualquer comunidade lusa que se encontra fora da
Europa.
Mesmo assim, a reunião foi avante com
os presentes, afinal, gente interessada. À mesa sentaram-se
os conselheiros Laurentino Esteves, José Eustáquio,
Dr. Tomás Ferreira, Mário Gomes e João
Dias. Cada um deles relatou as actividades em que se encontram
envolvidos e circularam alguns dos documentos que constituem
o seu trabalho em prol da comunidade. Mas num tom amargo ainda
que supostamente realista quanto às dificuldades que
se lhe levantam aos pés. Na atmosfera de um salão
de festas enorme, éramos uma escassa dúzia que
muito depressa enveredou pelo entabular de uma troca franca
de impressões, um diálogo de gente interessada
mas impotente para resolver aquilo que não tem resolução,
uma vez que o interlocutor principal dos Conselheiros, o Governo
da República Portuguesa e os Deputados à Assembleia
da República, contrariando todas as baboseiras que Executivo
atrás de Executivo tem debitado acerca dos “nossos
emigrantes”, agem em perfeita contradição
com a legislação que criou este Conselho Que muitos
opinam ter sido nada mais que um aborto que sucedeu ao nado
morto que o antecedeu.
Há males que vêm por bem:
Os nossos Conselheiros saíram mais unidos do que entraram
E a primeira pergunta surgiu no decurso da
franca troca de impressões no decorrer da noite chuvosa:
Se toda a gente sabe que os sucessivos (repita-se para que não
restem dúvidas) portugueses não ligam absolutamente
nenhuma ao Conselho das Comunidades, como é que os emigrantes
hão-de olhar com olhos de credibilidade para os compatriotas
que elegeram para representarem os seus interesses, à
margem mesmo dos deputados para “inglês ver”
que pomposamente julgam representar a diáspora portuguesa?
Na realidade esta é a triste mas verdadeira
realidade, a raiar um surrealismo perfidamente concebido e mantido
para ser ouvido mas não escutado.
A segunda pergunta poderia parecer uma provocação
a ouvidos incautos, mas não o era: Se os nossos conselheiros
– um deles chegou a servir brevemente como deputado –
não são ouvidos, são tratados com uma flagrante
falta de respeito pelos governantes e alvo de falta de credibilidade
por quem os elegeu, o que estão ainda ali a fazer? Porque
não se demitem, votando com os pés o desprezo
a que são votados por todos os lados? Unanimemente, a
despeito do desencanto em que vivem, disseram que não.
Que nenhum deles ara pessoa para desistir dos compromissos assumidos
e da responsabilidade de levarem até ao seu termo o cargo
para que foram eleitos.
Com todo o respeito que todos eles nos merecem,
soou um pouco a fundamentalismo. Mas não deve ser. Trata-se
de um naipe de pessoas honradas, cujo único erro, deve
ter sido o de acreditarem em quem não merece o esforço
deles e de haverem caído no logro de uma manipulação
político-partidária, do chamado “bloco central”,
protagonizado pelo Partido Socialista e pelo Partido Social-democrata,
tão diferentes hoje em dia entre si como, por exemplo,
o Banco de Portugal e a Caixa Geral de Depósitos: fazem
anúncios diferentes mas o objectivo é comum.
E talvez tenha sido a franca troca de impressões
que perpassou entre a mesa principal e as três (todas
com muitos lugares vazios) que a frustração veio
quiçá colmatar a brecha do partidarismo político:
estamos em crer, pelo que ouvimos e observámos, que cada
um dos conselheiros começou a sua intervenção
da mesma maneira, afirmando concordância com o que o havia
antecedido, inconfessadamente solidários no abandono.
E saíram ao fim da noite muito mais unidos do que haviam
entrado, certamente cientes que ali não havia –
nem haverá – ideologia partidária que os
ajude.
Os temas em debate
Os temas em debate? Há pois, há
que serem mencionados. Bom, os do costume: educação,
pensões e a precariedade dos serviços consulares
– que em Toronto até são dos melhores no
seio das grandes comunidades lusas, por todo o mundo, incluindo-se
aí a Europa. E isto porque todos sabemos a farsa em que
redundou a gestão do Ministério dos Negócios
Estrangeiros, o tratamento eivado de desprezo aos seus funcionários
no estrangeiro, a falta de cumprimento dos acordos firmados
com o Sindicato dos Trabalhadores Consulares e Missões
Diplomáticas, os pagamentos em atraso das actualizações
salariais desde há dois anos, a falta de progressão
nas carreiras por falta de concursos, o facto dos maiores consulados
portugueses – incluindo o de Toronto – se encontrarem
há anos sem vice-cônsules, e toda uma série
de descalabros que acabaram por empurrar os seus trabalhadores
para uma greve a 9 de Junho, na véspera das celebrações
de um Dia de Portugal que deveria ser de optimismo, esperança
e lícito acesso ao que os expatriados portugueses mais
querem: um ensino bem estruturado e apoiado de língua
e cultura portuguesa para os seus filhos como prioridade.
E foi neste tom que a sessão decorreu.
E escrevo sessão embora me apeteça considerar
o tal Fórum como realmente um “serão em
família”. Talvez que uma família de ideais
e soluções diferentes. Mas com o denominador comum
de uma reivindicação possível que só
não é viabilizada porque falta a vontade política
dos governos portugueses.
Para comprovar o trabalho desenvolvidos pelos
nossos conselheiros do Canadá, aqui fica para consulta
pública o testemunho da sua actividade.
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aqui para ver documentos.
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